Terapia Existencial-Humanista não existe.
Muito se tem comentado sobre a abordagem existencial em Psicoterapia e a variedade de práticas dela decorrente. As contribuições nucleares desta filosofia podem ser descritas como liberdade, escolha subjetiva, angustia, desespero e risco como expressões de uma compreensão de si ( Kierkegaard); como expressão da busca de uma filosofia da existência ( Heidegger); e como preocupação de analisar a pessoa concreta e única ( Sartre). Psiquiatras como L. Binswanger, M. Boss, V. Frankl, R. Laing e Cooper são algumas expressões da utilização do pensamento existencial em suas práticas clinicas. Alguns foram menos conhecidos na comunidade psicoterapêutica norte-americana porque não eram pensadores pragmáticos e por causa da natureza obscura de seus escritos. R. May introduziu tais autores nos Estados Unidos e esta importação conceitual teve que sofrer uma espécie de “aclimatação” aos valores da cultura acadêmica norte-americana, já embebida nas idéias humanistas em psicologia quando isso ocorreu. A partir daí, uma enorme confusão surgiu entre a abordagem existencial e a humanista que persiste até nos dias de hoje. Surgiu inclusive um termo “Existencial-Humanista” referido à união entre tais práticas. Contudo, embora muitos conceitos e até o clima de “setting” sejam parecidos, as diferenças são bem claras e se refletem na postura e papel do terapeuta. Em alguns pontos estas abordagens são potencialmente contraditórias e incompatíveis. Da mesma forma, existem terapeutas que dizem usar em suas práticas tanto a abordagem existencial como a psicanálise. Isto me parece mais absurdo, pois a filosofia em que ambas se apóiam é extremamente divergente, a começar pela visão do ser humano: a psicanálise é determinista, enquanto o existencialismo se apóia na liberdade de criação do eu.
Dentre as práticas existenciais encontramos aqueles que seguem os conceitos de Kierkegaard, outros os de Heidegger e ainda outros, Sartre. Talvez a menos conhecida na América seja a contribuição de Jean-Paul Sartre. O fato de existirem estes três filósofos como base não significa que o Existencialismo seja dividido, mas os profissionais que aderem à abordagem são especializados em psicoterapia e se esforçam para desenvolver a sua prática clinica autonomamente. Cada um desenvolve uma forma peculiar de colocar seus pressupostos em prática.
Não falamos de um sistema fechado, mas, principalmente, de uma atitude para com o ser humano no sentido de fazê-lo atingir a existência autêntica, de ajudá-lo a descobrir o que o impede de utilizar a sua liberdade de autocriação.
A Psicoterapia Vivencial é a abordagem existencial sartriana que vê o individuo como criador de si mesmo e de seu mundo. Utilizando o método fenomenológico, procura compreender a pessoa como ela realmente é, pois detecta padrões de comportamento para chegar ao projeto original pelo qual o individuo se faz uma pessoa. Cada ato simboliza o projeto e, portanto, comparando cada um deles chegamos a como o individuo aprendeu a se construir. O individuo se faz na medida em que é feito pela situação e pelos acontecimentos. Ao mesmo tempo em que se define, é definido por outro e nessa mescla de passividade-atividade, precisa se reinventar sempre. Ele não está pronto, como os essencialistas acreditam, mas se constrói a cada momento. Contudo, precisa tomar o controle deste processo, sabendo-se livre para dirigir o seu destino. O meio pode agir sobre o sujeito, mas para isso ele precisa percebê-lo como importante. O foco será sempre o olhar perceptivo. Certo é que existe uma constituição passiva que por si só representa um condicionamento abstrato,a proto-história. Entretanto, antes mesmo da adolescência, existe uma construção que irá se dar em cima desta proto-história: uma ambigüidade se instala nessa constituição expressa na forma singular de superar ou não esta passividade. As estruturas da família são internalizadas como atitudes próprias e mais tarde questionadas, aceitas ou ultrapassadas. Assim existem aqueles que conservam aquilo que o mundo fez deles, e os que o ultrapassam, escolhendo desenvolver seus próprios valores. Embora a família seja o depósito do conjunto constitucional traduzindo os conflitos da época, precisamos ressaltar que a família é o passado. O continuador passivo faz da infância a matriz de todas as explicações,mas a infância não pode ser vista como causa da vida adulta, pois embora inicialmente o individuo seja o resultado do que faz dele um constituído, através da ação ele mesmo supera a passividade do resultado. O individuo se define por seu projeto, por ser capaz de fazer e desfazer o que fizeram dele. O projeto proporciona a base de todos os seus atos e experiências.
Como a experiência é o foco deste trabalho, a ênfase somente pode ser dada no presente: estar no aqui e agora é descobrir um significado para a própria vida. O tempo linear é substituído pelo tempo dinâmico de Einstein: passado, presente e futuro estão numa linha vertical e se encontram no momento presente. Com isso percebemos que não há lugar para a interpretação, mas o foco é a compreensão que se mostra descritiva da realidade do individuo. Assim,a compreensão empática é o pilar deste encontro, o que possibilita a percepção do sentido concreto e vivencial do mundo pessoal a que o cliente se atribui. A empatia é a possibilidade intersubjetiva do vivido e, portanto, a essência do método fenomenológico. A atenção terapêutica está colocada não no cliente como objeto terapêutico,mas na percepção e sentimento que o cliente provoca no terapeuta.
O principal objetivo da psicoterapia Vivencial é maximizar a autoconsciência para fomentar a possibilidade de escolha; ajuda o cliente a aceitar os riscos e responsabilidades de suas decisões e, acima de tudo, aceitar a liberdade de ser capaz de usar suas próprias possibilidades de existir.
Ainda que as diferenças na clinica sejam apenas em grau, diferenças maiores surgem quando relacionadas com a abordagem humanista. Nesta há a crença na potencialidade humana, algo que uma pessoa já tem e que precisa ser atualizado. O papel do psicoterapeuta seria o de catalisador da potência, fornecendo um clima de aceitação para que surja o que se possui. Já o psicoterapeuta existencial é mais um instigador das vivências, pois por acreditar que uma pessoa nada possui antes de sua existência, instiga-a a criar seu próprio repertório de respostas, construindo o seu eu a partir de suas experiências. Desta forma, a visão humanista é considerada essencialista e, por isso, bem diferente do existencialismo. Ambas concordam que o instrumento básico seja a conscientização do cliente, mas a forma de operar esta verdade é através do papel de apoiador ou catalisador no humanismo, ou de instigador e frustrador no existencialismo. Quando se acredita na capacidade do cliente de inventar a si mesmo, e de refazer a sua história através da revisão de seus projetos, o terapeuta tem uma atitude mais ativa, convidando o cliente a perceber as formas que o impedem de ser livre. É estimulado a inventar novas respostas ou saídas, ao invés de dar a mesma resposta a diferentes problemas e nessa invenção, inventa-se a si mesmo.
Oi, Tê! Não tem como ler e ficar de fora, já que concordo com voce. De fato muitos profissionais, por desconhecerem a abordagem misturam e confundem o essencial para a atuação na prática. Acredito que, quem fala em existencial humanista não imagina que exista duas vertentes a existencial e a humanista e, na “nossa” visão existencial, acreditamos que o sujeito possa ter uma vida digna de ser vivida e, por isso um olhar humano para a liberdade de Ser. Já os que misturam existencial com psicanálise, podem ter “visto” a “psicanálise existencial” e não entendido, o que é uma pena! Mais uma vez a importância do profissional buscar supervisão e cursos de especialização clínica, para uma melhor compreensão. Indico sempre o seu, por saber a seriedade do curso e o seu profissionalismo.