O nascimento de uma nova consciência.
Tereza Erthal
Nestes dias de perturbações emocionais e físicas, tenho ouvido, muito frequentemente, dificuldades que levam até a uma desorientação espaço temporal em muitos. Sensações de que os dias estão rápidos demais; extremo cansaço; dificuldade de dar conta de tudo que antes fazia naturalmente; falta de humor equilibrado, etc. Muitas mudanças estão acontecendo, mas a principal diz respeito ao nascimento de uma nova consciência. Como? Quando? Não está determinado, inclusive porque o futuro é sempre indeterminado. A única coisa revelada e que podemos conhecer é este momento: o Agora! Do Agora, milhões de caminhos possíveis se apresentam e, com eles, uma enorme rede de infinitos futuros possíveis. Ainda que possamos dizer que o passado possa trazer alguma aprendizagem quanto a padrões comportamentais capazes, talvez, de prever um futuro mais provável que outro, a escolha continua sendo nossa. Nós decidimos se o passado determinará nosso futuro. Sabemos que previsões se relacionam a probabilidades e estas ao passado experienciado. Contudo, nosso poder como Pessoa traz a possibilidade de um rompimento com este passado, criando um caminho completamente diferente. Somos dotados de liberdade de escolha e temos, portanto, o poder de transformar, transmutar e recriar a nós mesmos. Neste sentido, somos co criadores da existência, já que possuimos o poder de criar a partir do nada.
Quando muitos falam desta nova realidade ou consciência, nunca podemos nos esquecer que somos mestres da nossa propria realidade. Toda mudança está relacionada à realidade interna de quem tenta.E há muitas realidades! A realidade escolhida vai responder às necessidades internas e aos desejos de cada um.
Vivemos num mundo de dualidade e nela experimentamos todos os extremos. É natural, nesta cena, vivenciarmos papéis distintos em diferentes dramas, como um ator numa novela: saudável, doente, rico, pobre, religioso, ateu,etc. O profano e o sagrado são vivenciados por muitos. Muitas habilidades surgem daí, afinal, tais experiências nos trazem a possibilidade de experimentar inteiramente o que é ser um humano, uma pessoa. Tais experiências humanas são intensas e muito variadas. Estamos imersos em um enorme campo de sensações, pensamentos e sentimentos e, devido à dualidade existente, o contraste e a intensidade entre elas se destacam.
O processo de criação é uma luta, onde muita resistência ocorre na tentativa de bloquear a realização dos sonhos. Como existe um intervalo entre a idéia e a criação, muitas coisas ocorrem ai. Fazer nascer uma idéia é um processo penoso e requer esforço pra muitos.É necessário perseverança, clareza mental e os sentimentos limpos, isto é, um coração aberto e confiante. Na dualidade tudo é lento, pois temos que lidar com todos os impulsos contraditórios, dúvidas, falta de apoio,etc. E muitas vezes, o brilhante papel de uma criação vai por terra exatamente por estes entraves. Contudo, são estes mesmos problemas, com seus fracassados resultados, que fazem com que a experiência seja tão valiosa.Podemos dizer que os desafios são nossos maiores mestres, de fato. Embora muitos se deseperem com a natureza não muito amena de suas realidades, que a realidade não lhes contempla com aquilo desejado, ou que o propósito criativo resulte em desilusão, em algum ponto do caminho uma chave surge. Esta chave, que pode ser prenúncio de paz, não será encontrada do lado de fora, nas possibilidades externas do nosso ser. Está mais próxima do que parece: está dentro de cada um. Uma vez tangenciada, uma invasão de alegria ocorre. Mas não se trata apenas de alegria; trata-se sim de um nascimento de uma possível maestria. O êxtase experienciado nestes momentos traz o poder de resolver tudo, absolutamente tudo o que está incompleto. Em contato com a própria dor, compreendendo-a e aprendendo a lidar com ela, não apenas traz a cura de si mesmo, como também conduz à compreensão da dor do outro.
Gosto de dizer que somos exploradores do desconhecido ou criadores de um mundo novo.Nossas explorações nesta dualidade nos tem servido para além da imaginação. Um novo tipo de consciência pode surgir, como uma espécie de alquimia que transforma chumbo em ouro. Não se trata de transformar mal em bem, como muitos reportam em suas religiões. Mal e bem são opostos naturais onde um necessita do outro pra existir.A verdadeira alquimia está numa terceira energia, se podemos falar assim: um tipo de consciência que dê conta de ambas as realidades, através da compreensão. É preciso deixar claro que não me refiro à compreensão intelectual, mas fenomenológica. Precisamos ir além destes opostos para criar esta nova consciência capaz de manter a unidade, em qualquer situação. No processo de procurar aquilo que tanto ansiamos, estamos criando bases para a sua existência. Ao explorar o novo, paradoxalmente, estamos criando-o. Não saber quem somos já em si constitui um incentivo à mudança, ao crescimento. Toda ignorância gera medo e o medo gera a necessidade de controlar. O resultado é a luta pelo poder.
A transcendência da dualidade, rumo à unidade, necessita do total desapego. Mas este somente poderá nascer se a dualidade for constatada e vivenciada. No jogo da dualidade, uma polaridade é escolhida: fraco ou forte, otimista ou pessimista, sensível ou insensível…Vivemos a polaridade escolhida até a última possibilidade, ou seja, somos os atores que se identificam com o personagem escolhido. Neste caso, não importa o lado, estamos dominados pela dualidade, completamente. O papéis são tão fortes que nos esquecemos de nós mesmos. Os dramas passaram a ser a nossa principal realidade.O resultado? Solidão e medo!
A dualidade nos convida a viver uma vida emocional instável, a estarmos completamente envolvidos com o mundo exterior ( a auto estima é construida no mundo externo), críticos, etc. Em tudo isso, não estamos realmente presentes.Nossa consciência acaba sendo dirigida por padrões de pensamento cobertos de medo. A tentativa de viver de acordo com a expectativa de outros é o melhor exemplo disso. Reage-se a partir do medo e o comportamento exibido parece ser o de recolher amor, admiração ou algum tipo de cuidado. As partes escondidas de nós mesmos ficam sendo atrofiadas.
Não é difícil mergulhar em si mesmo, como muitos dizem pra depois oferecerem métodos únicos de saída. Podemos fazer isso sozinhos e da nossa forma.Motivação costuma ser mais importante do que qualquer método. Ao entrar em contato com as partes escondidas de si mesmo, uma pessoa se torna mais presente. A consciência se eleva acima dos padrões conhecidos e geradores de medo. Esta consciência pode dar conta das mágoas, ressentimentos, raivas ou qualquer ferida interna.
E, então, o que precisamos fazer para parir este estado de consciência? Em primeiro lugar, escutar a nós mesmos, isto é, ouvir o que as emoções nos tem a dizer; cultivar o silêncio para que esta escuta seja completa; questionar os padrões de pensamentos e as regras comportamentais que estamos mergulhados. Em suma, tornar a consciência capaz de sustentar a dualidade em nossas mãos. É preciso encontrar o ponto certo de ancoragem num centro imóvel. Os filósofos gregos vislumbraram este estado que chamaram de “ataraxia” ou imperturbabilidade. Saímos deste centro ao vivermos o medo. Quanto mais liberamos estas energias, mais nos tornamos serenos. Vai se manifestando externamente a ponto das pessoas notarem algo bom e diferente que talvez nem consigam rotular. As mudanças internas são precursoras das mudanças em nosso mundo exterior. É a consciência que cria a realidade material que habitamos.
Ao experienciarmos o silêncio, pleno de alegria, saberemos que chegamos no lugar que tanto desejavamos. A felicidade não mais estará baseada no material, mas na forma como o experimentamos.
Enfim, a nova consciência, que agora surge, é aquela que nos resgata de sermos refém da continuidade da história. Convida-nos a ser o diretor principal de um enredo próprio. Fazemos a nossa história e, agora mais do que nunca, estamos a ponto de fazer uma marca, talvez nunca vista anteriormente: a de sermos seres com o poder de regressar às origens e resgatar a Luz própria. Mergulhem! Ousem! E se descubram senhores da Vida.