Da Filosofia ao Engajamento

Da Filosofia ao Engajamento

Tereza Erthal

A liberdade é muito mal compreendida. A princípio, um substantivo abstrato que tem um valor prático, pois acaba funcionando ideologicamente como uma oportunidade ou o desejo de libertar-se de responsabilidades, de problemas, de limites. O senso comum acredita ser a liberdade uma coisa, algo já dado, que implica em se fazer o que se bem se aprouver, vontades sem restrições. Nada mais avesso ao sentido existencial de liberdade!
Há uma confusão de definição entre liberdade, libertinagem e livre arbítrio. Libertinagem, no sentido figurado, significa , indisciplina; livre arbítrio, a possibilidade de decidir, escolher em função da própria vontade, isenta de qualquer condicionamento, motivo ou causa indeterminada. Ambos são liberdades em fuga.
“Somos, para nós próprios, a nossa própria obra de arte”.( Sartre). Isso significa um projeto transformador e pura criatividade. Somos livres para escolhermos, escolhemos ser, a partir do nosso projeto original. Nosso desejo de ser Deus, ou a perfeição, corresponde ao desejo de retirar a angústia, a falta, o erro, os sonhos…, na tentativa de navegar em águas tranquilas, seguras; desejo de controlar o futuro e extinguir as surpresas. Contudo, não há garantias para assegurar isso e asseverar o escoamento ao existir. “Ser é agir”, isto é, existir faz-se na ação. Somente na ação, através da escolha, posso construir minha existência e a necessidade psicológica. Isso explica quão difícil são tais opções: escolher é arriscar-se. No risco, abrimos novas possibilidades, antes encobertas pelo medo. Nessa abertura aparece o embate com o próprio ser, com aquilo que pretende ter como realidade acabada e concluída.
O homem atual anda na corda bamba entre a segurança do Humanismo triunfante, em busca de um eu autônomo, e os discursos sobre a dissolução do eu, sem deixar de ser objeto. Os que tentam compreender o homem, entendem a realidade humana como um conjunto de possíveis. E isso requer diálogo, interdisciplinar, porque não podemos olhar o homem com um único olhar. São muitas as perspectivas- História, Antropologia, Sociologia, Filosofia, Psicologia, etc. Toda a compreensão do homem, deve ser interdisciplinar porque o homem é diálogo.
As balizas de uma concepção geral do homem, o próprio homem ocidental, exibem um retrato de um homem que é dois: somos hebraico-cristãos e greco-romanos. O sucesso e a necessidade psicológica contemporânea tem tudo a ver, nutrida por uma crise perene, com a cisão originária.
Historicamente, a ponderação sobre o humano é sempre a última a surgir, muito depois dos astros. Isso talvez esconda uma extrema prodigalidade, já que cada cultura inventa um homem, uma realidade afastada da fixação dos astros. Enquanto a Filosofia contempla a realidade, o Psicólogo se apoia na experiência desta realidade- a experiência é tudo o que o indivíduo pode ter dela. O Psicólogo ajuda o cliente a experimentar a sua existência.
A Psicologia seria assim possível como ciência? Os que palmilham todas as concepções do homem, os que compreendem como expressão de sua radical instabilidade, e interpretam a realidade humana como um conjunto de possíveis, tornam incerto qualquer tipo de ancoradouro estável. Mas o que se realmente se busca está no reconhecimento de um estatuto ontológico.
Existe uma grande variedade de perspectiva em que se analisa a realidade humana, dentro e fora da Psicologia.Há uma recusa de qualquer pretensão de um único ato de visão. A Psicologia é uma ciência jovem, mas a maturidade não significa simplificação de algo tão diverso. O trabalho dialógico é a única necessidade externa.
Um Psicoterapeuta existencial deve mostrar-se cônscio de todos os múltiplos caminhos que se oferecem hoje às sondagens psicológicas, o que não impede que ele faça as suas escolhas e comprometa a sua resposta com visões determinadas, sem concessões à tolerância. Para um pesquisador, o mundo é o próprio laboratório. É preciso se comprometer com uma compreensão destituída de laivos de aquiescência passiva. Há um compromisso importante: se somos muitos, os muitos se entrecruzam e os olhares se tornam inevitáveis, incontornáveis.
Quais seriam as fronteiras da atividade terapêutica? Onde começa a terapia e onde ela pode ser dada por concluída? A procura pela terapia se dá por uma falta: um tipo de questionamento pessoal, o que se quer é preencher esta falta.Ainda não percebe que é esta falta que abre a janela para várias possibilidades, mas aos poucos vai percebendo que faltas existirão e que mais importante que o seu preenchimento, é o processo, a forma como lida com isso. Em qualquer caso, o homem deve ser, tanto quanto possível, responsabilizado por si e pelos outros, e deve ser levado a assumir a completude de sua liberdade. Tudo é pedagogia: a terapia “cura” e educa e nela faz-se presente a figura do outro.
“ A liberdade é a existência e nela a existência precede a essência.” Nunca foi tão forte e necessária a conscientização dessa verdade. Criamo-nos e afirmamo-nos nessa liberdade fazendo essas verdades. Nada pode salvar-me de mim mesmo: sou o responsável pela minha existência, pela minha escolha, e ao fazê-lo, faço-o como pessoa. Posso lançar-me aos meus possíveis a cada momento. Assim, a definição de mim mesmo é escrita pela sucessão de meus atos, em cada situação concreta. Não posso ser definido de uma vez por todas como isso ou aquilo, pois invento o meu ser em cada situação em que me vejo laçado. A percepção limita os possíveis. Quanto maior a percepção, maior a abertura. No instante em que existo, sou um fazedor de escolhas
De uma Ontologia( estudo do ser, homem como homem) evoluindo para uma Psicanálise proposta em suas obras “Ser e Nada”, “Questão de Método”, “Idiota da Família”, Sartre apresenta suas mudanças pela função do pensamento anterior com as teses da sociologia.Uma forma de compreender o homem numa visão integrada da Psicologia com a Sociologia.
Nos tempos atuais, ganharam visibilidade as psicoterapias que valorizam a possibilidade de o homem olhar para si mesmo de forma mais destemida e mais responsável pelas suas ações. A Psicoterapia não é uma práxis sem esforço! O trabalho convida o cliente a ser responsável mais por si mesmo, a tomar a si como livre para ser, para criar a sua história. Também convida a tomar consciência de que não caminha sozinho. O indivíduo é ser-para-outro, que significa que a minha consciência precisa ser reconhecida pelo outro para existir. Isso também não é uma tarefa fácil, uma vez que a relação é conflituosa: há um embate de consciência na tentativa de não perder a liberdade. É quando o outro é colocado como objeto, o em-si, sem se dar conta de que não há como apreendê-lo como tal porque também é consciência. Como objetos, tentamos nos transformar exatamente naquilo como aparecemos pro outro: se existe censura, sou objeto de reprovação; se existe aprovação, sou objeto de admiração. Seja qual for o olhar, me petrifico! Esta é a base da frase famosa “ O inferno é o outro”, citado na peça “ Entre Quatro Paredes”. O inferno não é um lugar, mas o olhar; o próprio olhar projetado no olhar do outro.
A dificuldade de assumir a si, de tomar a si plenamente e se construir sem referência total do outro, faz o homem perder a principal característica humana ao meu ver: a liberdade.Neste inferno, que representa a morte em vida, condenam-se os homens quando renegam sua liberdade e tentam negar a de seus semelhantes.Julgam outras liberdades porque nunca reconheceram suas próprias liberdades. Estar morto é ser presa dos vivos. De nada serve recomeçar a vida se não se consegue modificar a própria atitude! A morte transforma a vida em destino. A ideia passada na peça “ Entre Quatro Paredes” traz o drama de todos aqueles que vivem uma vida fechada, voltada para si mesmo, uma vida defensiva em relação aos outros, à mercê do olhar dos outros.
Também a peça “As Moscas”, Sartre nos traz uma lição:
Orestes: “um jovem, rico e belo, sábio como um velho, livre de todas as servidões e de todas as crenças sem família, sem pátria, sem religião, sem profissão, livre de todos os compromissos e sabendo que nunca deverá comprometer-se, enfim, um homem superior”.
Por que Orestes não se satisfaz? Dá-se conta de que não tem lembranças, de que nada lhe pertence, de que não é de parte alguma, que não é nada. “Sou livre! E que vazio é a minha alma. Existo apenas…”
Cada personagem de uma peça representa a escolha de uma saída. Cada situação é uma ratoeira, com muros para todos os lados. Não há saídas à escolha; inventa-se uma saída. O indivíduo, então, tem que ser inventado todos os dias; não pode estagnar.
É pela tomada de consciência que começa uma transformação moral, ao longo da História, dentro do relativo. O olhar do outro garante a existência da liberdade. E se o homem é um ser-em-relação, ele é o mundo; não é separado do mundo.A sua consciência, suas reações, suas crenças, suas ideologias, seus medos e ansiedades são semelhantes àqueles do restante da humanidade.Se ele mudar, afetará o todo. De acordo com Sartre, o homem ao se escolher, escolhe toda a humanidade. Nunca foi tão urgente a conscientização disso! E entendemos que o seu ponto de partida é a intencionalidade e não a realidade. Sua meta é examinar a consciência no mundo.
A nossa escolha fundamental de nós mesmos – Projeto Original- é como me estimo ser, como me desejo no mundo. Embora constelada na infância, porque aprendemos através de como sentimos e interpretamos as nossas relações a ver o mundo e ao outro de uma determinada maneira a nos ver no mundo. Respondemos ao olhar do outro, ao toque, à fala…Nossas experiências de vida irão se referenciar nessa base. Todas as escolhas são congruentes com a escolha original. Contudo, as situações da vida são dinâmicas. Cada situação nos instiga a uma nova falta, indica a abertura de possíveis. E tudo isso é visado no presente. Nessa concepção de tempo dinâmico, a presença do outro- o terapeuta espelha as intenções do cliente, descrevendo o seu experienciar conforme expresso na relação. O terapeuta é uma testemunha ocular do compromisso que o cliente passa a estabelecer consigo mesmo.
Mas se toda relação é conflito, como se estabelece? À medida que a liberdade vai sendo estabelecida, e o cliente aceita a sua condição humana, o cliente se faz responsável por aquilo que deseja modificar em si mesmo. Um paradoxo maravilhoso surge: quanto mais livre se vê, mais se reconhece a liberdade do outro. As relações saudáveis são possíveis apenas nessa condição.
Enfim, o trabalho da Psicoterapia Vivencial leva a pessoa a experienciar a sua existência, aceitar a sua condição humana, engajar-se em atos, arriscar ser e aí está a beleza do quadro. A terapia instiga o cliente a descobrir as formas que o impedem de ser livre e, com esta percepção, resgatar a sua liberdade, luxo de todos nós!

Liberdade em questão

Tereza Erthal

Seria a liberdade um privilégio eventual de uma propriedade a conquistar? Seria o mesmo que vontade, decisão consciente ou deliberação racional? De acordo com Sartre, se toda a natureza é regida pelo determinismo, ao homem, e só a ele, cabe o reino da liberdade.
A liberdade é a razão mesma da consciência. Para a realidade humana, ser é escolher-se. Neste sentido, uma pessoa não poderia ser ora livre, ora escrava; ou é inteiramente livre, ou não o é. Somos livres para escolher, mas não somos livres para deixar de ser livres. Os limites da liberdade residem na própria liberdade.

Situação e ato: A liberdade deve manifestar-se concretamente, dar provas de si em ato. Ser livre é fazer escolhas concretas. Não se concebe liberdade sem escolha. A individualidade e a finitude de nosso ser também são definidos pela realização de alguns possíveis com exclusão de outros. Se tivéssemos infinidade temporal, realizaríamos todos os possíveis, mas não seríamos livres, pois não passaríamos de um desenrolar em série infinita de todos os possíveis e desapareceremos como individualidades. A liberdade subentende o fato de que todos os possíveis não são realizados. A consciência é livre por ser inacabada, uma espécie de insuficiência de ser.
A liberdade também não é pura abstração ou absoluta transcendência porque a consciência não vive apartada do mundo, mas inserida nele. A liberdade é situada na realidade objetiva. Se desejo ser uma mulher alta, a minha livre decisão não é capaz de me tornar o meu desejo.
Resistência necessária: Assim como a mudança temporal não é absoluta, pois exige alguma relação com algo que permanece, também a liberdade exige algo que a contrarie. Precisa de um campo de resistência do mundo. Sem obstáculos não há liberdade. Deve haver uma separação entre a concepção de um ato e a sua realização concreta. Somos livres porque a separação entre o fim a realizar e nós próprios é mediada pelo mundo. No sonho, a consciência não depara com obstáculos, assim como não há necessidade de ação.A concepção acarreta a aparição instantânea desse possível, que deixa de ser um possível . Se imagino o helicóptero que desejo ter, imediatamente o vejo, diferente da vida real.
Papel do corpo: É o nosso corpo que impõe a necessidade de agir para concretizar uma idéia. Se pudéssemos conceber uma consciência sem corpo, nenhum projeto teria cabimento, já que não haveria possíveis, apenas realidades espontâneas, como no sonho. Sendo a consciência também corpo, e não pura abstração, é a ação deste corpo que separa o esboço de um projeto de concretização.

Senso comum: Para o senso comum, somos livres quando nada nos oprime ou impõe resistência. Contudo, esta é a liberdade onírica. A consciência tem que estar comprometida na liberdade real. A situação é o obstáculo necessário que devemos transpor para realizar os fins. Quanto mais pressões, mais claramente a liberdade se afirma.
O conceito cristão de livre arbítrio nos diz que o homem possui o bem infinito de sentir-se livre interiormente, seja escravo ou senhor. Isso nos leva ao conformismo: não haveria razão de mudarmos as condições da vida social para o homem que já possui integralmente a sua liberdade. O conceito sartreano de liberdade não afirma que um homem cativo é livre para pensar o que quiser, mas é livre para agir dessa ou daquela forma, seja para tentar uma fuga, ou resignar-se ao cativeiro. Isto porque a liberdade de escolha implica já um fazer.
O sucesso ou o fracasso do nosso projeto não importa para a nossa liberdade. No mundo real, o fato de não conseguirmos realizar um fim almejado não significa que não sejamos livres. A verdadeira liberdade não é a liberdade de obtenção, mas de eleição.Não se trata de fazer o que se quer, mas em querer fazer o que se pode.
Por ser livre, a consciência, ao surgir no mundo, é uma total indeterminação de si mesma. No início é apenas uma possibilidade de ser. A partir desta pura existência, o homem se faz a si mesmo e cria a sua essência. Sem ter onde se apoiar, nem fora nem dentro, o homem fica obrigado a suportar o peso de sua liberdade, solitário, sem ter onde se agarrar. Resta-lhe ser o único responsável pela sua vida.O homem é o único legislador de sua vida e a lei é “escolhe-te a ti mesmo”, ou como prefere Jules Lequier, “fazer e, ao fazer, fazer-se”. A cada momento o homem deve escolher o seu ser, lançando a seus possíveis e construindo, pouco a pouco, a sua essência, através destas escolhas, contando para agir somente com a voz da sua consciência. A definição categórica de uma pessoa, afirmando que ele é definitivamente algo, não procede. Como o homem inventa perpetuamente o seu ser, sem possuir uma essência imutável, sua definição jamais se completa em vida e se conserva aberta até a sua morte. Como disse Sartre, “uma hora antes de morrer, ainda estou vivo”.

Liberdade e condicionamento:
É comum pensarmos que somos responsáveis por nossos atos quando manifestamos a força da nossa vontade. Numa situação perigosa, decidimos agir com coragem. Minha vontade é soberana, de acordo com esta teoria. Concordando com ela, nos iludimos sobre nossa liberdade, pois seríamos condicionados por fatores externos ( nossa situação no mundo, condições materiais, estado econômico…)ou por causas internas (forças inconscientes, instintos…). Tais teorias aceitam que ora somos livres, outras não. Mas a consciência uma vez livre, tem que ser livre sem cessar porque se uma única vez uma compulsão motivasse a nossa consciência, não teríamos como recuperá-la: de onde iríamos retirar essa liberdade perdida para deixarmos de ser um joguete?
Um ato voluntário não é a manifestação da nossa liberdade, mas de um modo de ser da consciência, já sustentada por uma consciência originária. Ao dizer “fiz porque quis”, o fim visado já estava anteriormente posto.
Igualmente falso é contrapor o ato voluntário ao ato emocional, como se o primeiro fosse sinal de liberdade e o outro escravo das paixões. Quando nos emocionamos, também agimos livremente. As paixões não nos são impostas. Trata-se de um projeto com um fim. Este equívoco se deve às concepções errôneas das emoções.
Alguns psicólogos acreditam que a emoção surge de repente por uma causa oculta, inconsciente. Quando sentimos medo, sabemos que temos medo e do que tememos. O medo é sempre medo de algo. Conserva-se na emoção o princípio da intencionalidade: quando agimos emocionalmente, nossa consciência se organiza livremente com vistas a um fim. Mas não há reflexão; usamos a consciẽncia irreflexiva, voltada para o objeto de emoção. Como não refletimos, achamos que foi inconsciente. O exemplo do Sartre é bem esclarecedor: obrigada a confessar um segredo, começo a chorar. Não choro porque não posso confessar, mas para não confessar. A emoção não é determinada por uma causa, mas representa uma intenção projetiva da consciência livre. É uma conduta mágica que a consciência se utiliza para transformar o mundo real, que escapa ao nosso controle. Escolhemos a fantasia, como uma forma escapatória para iludir as dificuldades.
Assim, tanto a emoção como a vontade são dois modos de ser livre. Pela emoção, optamos pelo aspecto mágico; pela razão ou vontade, pelo aspecto real. Posso, numa situação me escolher medrosa e em outra, corajosa.
Motivos: O projeto humano é movido por uma intenção e esta se baseia em motivações. A situação em que nos encontramos (realidade objetiva, escolhas do passado, etc)são fatos irrefutáveis, mas em sua neutralidade, não são capazes de motivar nossos atos. É a consciência que atribui sentido a elas e delas faz um motivo para os seus atos.
Da mesma forma, fatores subjetivos não o podem fazer. Os complexos são projetos: se escolho a minha imagem como problema para ser uma atriz, foi o meu projeto de ser atriz que me elegeu como feia, por exemplo. Criei um motivo para agir timidamente, com vergonha da minha aparência física. O motivo só aparece a partir da liberdade. Então, nenhum motivo pode atuar sobre a escolha original que fazemos de nós mesmos. O motivo de uma ação surge somente com o aparecimento de um fim futuro.

Conclusão:
A liberdade não pode ser determinada por nenhuma causa, nem limitada por nenhuma outra. Só encontra no mundo os limites que ela mesma colocou. É ela que estabelece os obstáculos que irá se defrontar. Apenas a liberdade pode limitar a liberdade. Ela nos aprisiona nela própria porque estamos condenados a ser livres.Não posso escolher não ser livre, do mesmo modo que não escolho ser livre. Se pudesse escolher-me livre ou não, isso implicaria uma liberdade prévia de escolha, e, uma vez livre, já o seria então pra sempre!

O amor mata?Um depoimento pessoal

Certo dia entrei em uma discussão com a minha oposição. Disse ela que amor não matava e eu lá, teimando que sim. Amor mata!!! Amor não mata!!! Claro que amor não mata!. Você não vê? Tantas pessoas por aí sofrendo, morrendo, entrando em vícios por causa de um amor perdido, por amarem e serem magoadas, traídas. Mas é claro que o amor mata, continuei no meu diálogo. Terminou tal discussão, mas cada qual com sua afirmação. Depois de um tempo, quando me vi na situação de que fui traída pelo o que acreditava ser o amor, estavam ali eu e minha afirmação: falei pra mim mesma, então o amor está me matando, mas como pode se fazia tudo para tê-lo, de estar junto dele? Não, não era amor que estava me matando! Era a falta dele!!! Sim, a falta dele estava me sugando, mesmo acreditando firmemente que eu tinha amor, estava eu jogada no desamor. Vivia fora, na busca incansável pelo amor em tudo, menos em mim. Buscava o amor, a relação e tudo que havia de belo e de aprovação no outro.
Em meio a tantas mágoas, raivas, tristezas, ansiedade, enfim, em meio a tanto desamor,deparei-me com o que havia feito da minha existência até aquele momento; via-me desamparada, sozinha, culpando quem havia feito aquilo comigo. Demorei pra então entender, não havia culpados! E sim uma única responsável- eu que fiz aquilo comigo! Como poderia estar colhendo tanto desamor, se apenas desejava o amor? Este é o cerne do problema: procurei tanto o amor que implorava do outro. Era eu que precisava me dar, mas como? Havia uma necessidade, uma busca de atenção e carinho de fora, que precisavam ser sentidas dentro. O fora só aumentava o meu apego pelo outro e o desapego comigo mesma. Estava escravizada pela necessidade da busca do amor. Para cessar aquela carência, colada em mim, tinha que encarar o espelho.
Há quantos anos vinha me maltratando? Olhei pra mim mesma! Foi aí que me percebi. Vigiei meus gestos , meus pensamentos e sentimentos que tinha colecionado sobre mim. Estava tudo ali! O desamor estava comigo e não com o outro! Dava-me tanto desamor, que quando encontrava qualquer pontinho de toda atenção e cuidado que eu não me dava, focava, como um laser, a busca de tudo o que precisava ali, neste ponto de aplicação. Mas como o laser, depois de algum tempo queima o que está a sua frente, vi-me queimando tudo ao redor, em busca de algo que estava dentro de mim. Eu tinha o poder! O poder de ser quem eu quisesse e, principalmente, o poder de mudar a minha história. Reconstrui-me com este novo olhar sobre mim e sobre o amor.
O que posso dizer desta experiência? Conheça-se, realize-se, respeite-se, cuide de si primeiro! Compreenda que o amor está em todas as direções, em tudo o que deseja e escolhe fazer. O amor está em você e em como escolhe olhar. Olhe-se com calma, quando a vida dá aquela rasteira, que muitas vezes só conseguimos focar no desmerecimento, tão presente na nossa sociedade. Os conflitos e medos costumam ser um alerta para termos atenção e não para nos deter. Ter uma vida interior ativa nos leva à refletir sobre o que sentimos, como sentimos e como pensamos. Será que isso me faz bem? O que é meu e o que não o é? Não há real crescimento se não for na verdade e no amor. Como aprendi, o amor está dentro de nós!
Agora a resposta ao título: O amor mata de fato? O amor não mata, mas a falta dele sim!

por: Catarina Valentim Willi Cabral da Rocha
Psicóloga clínica, aluna do curso de formação em Psicoterapia Vivencial.

DESENVOLVIMENTO DA TÉCNICA: “FAZENDO AS PAZES COM O SEU PASSADO.”

Desenvolvimento da técnica “Fazendo as pazes com o seu passado”
Tereza Erthal
I.Introdução:
Aquilo que nos fez sofrer no passado, pode se arrastar no presente e atravancar nosso progresso futuro. É como se a perpetuação dessa sofreguidão criasse uma rede onde tudo convergisse para a nossa dor. Ressentimentos impedem de vermos os prazeres da vida e as dores da alma vão se localizando no corpo e deixando suas marcas através da doença. Isto não significa que o passado nos determina, mas que o passado inacabado, torna-se sempre presente, atuando sobre nós como uma influência nefasta. É mister tomarmos consciência disso para que possamos agir em nosso proveito.
Tem sido provado que a capacidade de desenvolver o perdão faz com que as pessoas vivam bem mais e com mais qualidade de vida. Mas o problema em perdoar está em confundir o perdão com conciliação ou aproximação como velhos amigos, quando a pessoa a ser perdoada era um algoz. Mas não se trata de fazer as pazes com ela e esquecer o que foi feito. O que o perdão significa é um novo olhar para a situação, uma ressignificação. A situação é vista de uma nova forma. O passado factual não pode ser mudado, mas quando damos um novo significado a ele, tudo muda. Libertamos a pessoa e a nossa parte na história. A libertação, através do perdão, ocupou um lugar importante n ciência, embora alguns ainda a vêem pelo aspecto religioso. Muitas doenças já foram estudadas ( alergias, problemas cardiovasculares, gastrites, fibromialgia, lombalgia, enxaquecas e outros), indicando que elas são o resultado de algo inacabado que grita por atenção. Estudos vem colaborar para essas afirmações- Hope College, em Michigan, pela psicóloga Charlotte Van Oyen Witvliet, Stanford com Fred Luskin que criou um projeto para o perdão, Robert Enright da Universidade de Minessota que criou o Instituto Internacional do perdão…, são alguns exemplos desse avanço. Existe um poder terapêutico no perdão.
“Não perdoar é como pegar um carvão em brasa para jogar no outro: você, com certeza, será queimado.” Buda
Portanto, nesse trabalho, estamos focados na libertação de parte do eu que ficou aprisionado num passado doloroso. Trazemos este passado para o agora e ressignificamos as partes. O perdão parece finalizar a compreensão, alterando o presente. Como Sartre nos disse, chega a hora em que temos que escolher entre dois caminhos: ou continuamos continuadores passivos da nossa história, ou a ultrapassamos, criando o nosso próprio roteiro. Qual seria a sua escolha?

II. Compreendendo a relação da consciência com as doenças:
Experienciamos o mundo através da consciência. Trata-se de um estado de captação que nos leva a agir de uma forma peculiar. Na tentativa de preencher o seu vazio, a consciência se volta para os fenômenos do mundo através dos sentidos. Pode captar o fenômeno pela imaginação, pela audição, visão, etc. Também sabemos que existem várias formas de consciência. Sartre definia dois modos de consciência ( irreflexiva e reflexiva), bem definidas por Descartes. A primeira é irracional, passiva, irreflexiva e, portanto, sem qualquer julgamento sobre o que é percebido. Digamos que podemos entendê-la agora como um modo que inclua o que é instintual, isto é, um modo de consciência mais baixo, ligado às sensações. Na consciência de segundo grau ou reflexiva, já existe um eu que reflete e julga. Nesses casos, as atividades mentais são necessárias para que ela possa existir. Por mente denomino o conjunto das faculdades intelectivas do homem, a função da personalidade que Jung chama de pensamento e os psicólogos denominam intelecto. A mente dá ao homem o poder de pensar, raciocinar e tomar conhecimento do que é percebido por meio dos sentidos. É o que dá ao homem a condição de ser consciente de si. A mente é impedida de ser a grande mediadora entre o mundo subjetivo e o mundo objetivo, porque é o único aspecto da personalidade que tem uma natureza dupla: o pensamento concreto e o pensamento abstrato. Entretanto, o homem, na maioria dos casos, usa apenas a parte exterior da mente, desenvolvendo a mente o pensamento concreto, que o impede de perceber as idéias intuitivas. Em um patamar mais alto estaria a mente abstrata, com suas análises e reflexões abrangentes, descentralizadas. Entre as duas parece existir um outro modo de consciência, a emocional, que em vez da forma de captação da realidade se processar apenas pelos cinco sentidos, constitui outra forma de apreensão. Se a primeira é irreflexiva, a segunda poderia ser vista como pré-reflexiva, indicando que nela existe a capacidade potencial de reflexão. Esta consciência emocional pode variar entre a impulsividade, apegos e sentimentos menos elaborados de um lado, até as aspirações mais altas e sentimentos elevados, buscando o bem geral, de outro. O homem emocionalmente maduro possui a capacidade de identificação, empatia ou faculdade de dar. Aprende a superar o egoísmo, os apegos e toda a forma de possessividade, subestimando-os pelo amor altruístico e incondicional.
Assim, podemos falar que existem quatro modos de consciência: sensorial, emocional, mental e espiritual ou consciência intuitiva. As três primeiras, quando integradas, levam ao desenvolvimento da autoconsciência, próprio da personalidade que aprendeu a se conhecer, a cultivar atitudes que lhe faltam, a construir um caráter. A autoconsciência evolui para uma consciência intuitiva ou espiritual, em que há uma transferência da consciência pessoal para a impessoal, na qual há equanimidade ( não há predomínio nem do prazer, nem da dor),em que há o cultivo de felicidade pela confiança interna, em que a paz transcende à racionalização. É pela intuição que tocamos na esfera superior e compreendemos o sentido.
O mundo da intuição é o mundo do significante e do significado. Se a mente nos ajuda a compreender o significado da origem dos acontecimentos, a intuição nos devolve a compreensão das finalidades. No modo intuitivo de consciência há sensibilidade quanto às possibilidades novas que as coisas possam oferecer. Na passagem da consciência mental para a intuitiva ocorre o sofrimento decorrente da separação temporal que tem de passar para transcender. O recolhimento vira uma busca, não como fuga, mas como um sentido. É neste ponto que o homem descobre não estar sozinho. A consciência intuitiva é, na verdade, uma consciência grupal, na qual o homem se percebe fazendo parte de um todo. É a verdadeira consciência, da qual as outras são apenas reflexos imperfeitos. A “ voz da consciência” é uma voz transcendente. É ela quem indica o sentido, tantas vezes procurado e vivido como vazio.
Se ficarmos no plano ôntico, da imanência psicológica ou a esfera circunscrita da pessoa, a consciência intuitiva não pode ser analisada. No entanto, assim que nos transpusermos para uma dimensão ontológica, ela deixa de ser problema, passando a ser um elemento existencial, um atributo da existência humana. Vemo-nos jogados em um mundo no qual os objetos parecem brilhar, como se fossem iluminados por dentro. Essa luz é o “insight”. Inspirar é levar o ar pra dentro, um fluir natural dos sentimentos, através da mente.
A busca para atingir esse modo de consciência é longa e dolorosa. Exige disciplina, intenção e uma crença inabalável na direção pretendida. Quando a consciência espiritual é tocada, dois fenômenos da consciência ocorrem: amor e arte. No caminho para o amor, a inspiração cresce; no caminho para a arte, nasce a criação.
Pelo que já foi dito, podemos dizer que vivemos numa consciência tridimensional onde há uma forte crença nas limitações e deficiências colocadas nas pessoas e nas condições do meio. Uma luta enorme é travada, permeada por um profundo medo, originando um extremo cansaço que permeia as sociedades. A grande maioria das pessoas não está em contato com as suas habilidades, isto é, a sua capacidade natural e ilimitada de criar. Vive-se a ilusão de estar sozinho e separado, sem apreciar a singularidade individual do Universo. O tempo é a maior ilusão e, como uma teia, prende os desavisados.
Mas a consciência tem evoluído para a 4D, que nos leva a sentir que fazemos parte de algo maior que nós. Não há sensação de estar só. O que existe é uma consciência das energias ao redor e o indivíduo se abre para o apoio que existe à sua disposição. Começa a entender e vivenciar o seu lugar dentro de algo bem maior (Consciência Universal) e experienciar uma orientação mais intuitiva.
A consciência 5D passa por um estado de Amor incondicional, um estado de unidade com toda a consciência de vida, uma experiência direta de ser uno com a Consciência Universal, além de um alinhamento consciente com o amor puro de sua essência.
Passar de um estado de consciência 3D para uma de 4D ou 5D é excitante e tem um grande papel na transformação. Quando se toma a atitude de dar início ao despertar, você começa a assumir o seu lugar na vida. O estar desperto leva a um estado diferente de consciência (vibração diferente das células). É a frequência do amor que não apenas nos muda, como afeta as pessoas à nossa volta e todas as coisas vivas. As mudanças que virão, exigirão que você esteja mais consciente do papel que representa agora.
Em função de tudo isso, desenvolvi uma técnica capaz de acessar o modo de consciência que ficamos presos no passado. Este aprisionamento se deve a alguma experiência traumática que fomos submetidos e, sem capacidade de transcender a dor, empurramos para debaixo do tapete ou fingimos que nada aconteceu. Desta forma, a experiência passa desapercebida ( atitude de má fé sartriana), mas não as dores que foram geradas e que ainda permanecem. A impressão é de que estamos sendo atacados, que esta dor não nos pertence, que a vida está sendo injusta. Contudo, estas dores somos nós gritando em algum lugar do passado/presente, querendo a atenção para poder partir.
Passei isso há algumas semanas atrás. Tive um problema na lombar que evoluiu para dores na ciática. Que dores fortes! Em muitos momentos desejei a morte, pois não conseguia dormir (ficar deitada era impossível) ou sentar para ler ou algo assim. As dores dilacerantes me faziam ficar acordada por toda a noite, andando pela casa, já que apenas andando dava um pequeno alívio. Chorava, brigava com Deus, tinha raiva. Nada adiantava, nem mesmo todo o tratamento medicamentoso e fisioterápico. Parecia que eu estava abandonada e que nada iria acabar com o meu sofrimento. Lembrei-me de um filme de nome “ A Guitarra”, de origem argentina, no qual a protagonista, em um só tempo, descobre um câncer terminal, perde o noivo e o emprego, no dia da revelação. Desesperada e sem rumo, retira todo o seu dinheiro e começa uma jornada de coisas que sempre quis e não podia possuir, e passa a viver o momento presente apenas. Viver o agora na sua mais concreta forma. Depois de tantas experiências, descobre que já se passaram dois meses e nada tinha acontecido à sua saúde. Visitando os médicos, descobre que o mal que a invadia, havia desaparecido. Questionando o porquê, foi-lhe dito que o mal que nos acomete tem um meio propício pra se alimentar. Quando mudamos este meio, o tumor se sente fora do “habitat” que o construiu e perde suas forças.
Outro exemplo que me ajudou foi a palestra de uma neurocientista, há uns anos atrás, que foi acometida de um derrame poucos minutos antes de sair de casa para o hospital em que trabalhava. Sabendo que o tumor que mantinha no cérebro era inoperável, primeiro se desesperou. Mais tarde, vendo que o desespero em nada contribuía para um estado melhor, começou a conversar com ele, baseada no fato de que se construiu, esta coisa lhe pertence, faz parte de si. Diariamente, estabelecia um diálogo com ele da seguinte maneira: “ sei que fui eu quem o criou; sei que você não é um invasor como supunha; você faz parte de mim. Portanto, precisamos fazer as pazes e conviver da melhor forma. Seja bem vindo! Estamos no mesmo barco. Não pretendo lhe expulsar, mas aceitá-lo como é. Se eu o fiz, cabe a mim entender e perdoar a você e a mim mesma por esta etapa.” E o diálogo ia ficando mais íntimo entre eles. O resultado? O tumor sumiu! O que o fez desaparecer? O meio no qual foi construído era diferente do meio no qual estava sendo compreendido. Exatamente igual a experiência do filme, também verídica.
Pensando em tudo isso, e com todo o tempo do mundo na madrugada, achei por bem entender o que a dor queria significar. Se antes brigava e sofria ainda mais, agora tinha jogado a toalha e iria tentar me harmonizar com tudo. Comecei estabelecendo um diálogo com a dor; ela me sinalizava algo que não sabia. Havia algum medo ali que precisava descobrir. Vi que estava completamente sozinha, física e emocionalmente. Era uma sensação bastante dolorosa, mas continuei. Pretendia partir de um lugar de desespero para chegar a um lugar de cura física e emocional. Sabia que a melhor maneira de vencer o medo era o movimento consciente na direção do sentimento e da respiração. Fiquei consciente do sentimento de medo, à medida que avançava. Quando fazemos isso, o medo se dissipa. O medo não pode nos machucar. É somente um sentimento criado por nós diante da baixa estima que desenvolvemos.
Há feridas que carregamos no coração que precisam ser curadas. Muitas destas feridas estão conosco há muitos anos. As feridas abertas nos mantém separados do amor que é direito nosso vivenciar nesta vida. A abertura para este novo aspecto do amor produz em si a cura e uma nova sensação de bem estar dentro de nós.
Aprendi que era preciso ser paciente comigo mesma enquanto empreendia esta jornada. Cada experiência que eu fiz neste período serviu para eu estreitar meus laços comigo mesma. Tais alinhamentos me ajudaram a desenvolver-me no meu Self e acelerar a nova consciência da vida e verdade. Deste contato íntimo com as minhas dores e medos, entendi que precisava de um método para eu não me perder na experiência. Depois de estabelecer este contato com a dor, comecei a entender que estava passando por uma revolução emocional e precisava saber quais fases da minha vida eu teria ficado presa em alguma sensação. Comecei a técnica…
III.A técnica propriamente dita:
Em primeiro lugar, achei por bem visitar todas as minhas idades e a dividi em períodos de cinco em cinco anos (0-5;5-10;10-15,etc). A cada etapa, deixava minha mente livre pra seguir as emoções que acompanhavam as lembranças engavetadas. E, claro, elas existiam. Não se trata de recalque, como Freud nos disse. Acredito que o homem é um ser autoconsciente, capaz de tomar consciência de si, seja qual for o problema enfrentado. O que ele precisa é disciplina e vontade, sem julgar nada do que for ver.
A nossa história pode nos ajudar a dar os primeiros passos em nossa jornada, mas chega o momento em que nós temos que deixar a história pra trás. A cura somente pode ser alcançada se for descolada da história. É preciso deixar de ser vítima para assumir a responsabilidade pelo papel representado para ter a experiência. Identificamo-nos com a nossa história, mas somos muito mais do que ela. É preciso coragem pra abrir mão da história e dar um salto em direção ao Self. Precisamos deixar a história limitada tridimencional, que acreditamos ser por pura autossabotagem ou má fé, para atingir a verdadeira liberdade dentro de nós. O processo de autocura é amor, paciência e compaixão por nós mesmos. Devemos ter paciência com os erros que cometemos e perdoarmos enquanto vivemos o nosso dia a dia.
Primeiro devemos mudar conscientemente e estar dispostos a participar das mudanças dentro de nós. Temos que entrar em contato com a nossa criança interior, presa no emaranhado de sentimentos por nós traçados. Esta criança interior guarda os traumas das vivências passadas. Quando apoiar a criança, você vai começar a se conectar com todos os sentimentos que estão ali. Alguns destes sentimentos são profundos. Permita-se sentir e lembrá-lo do que ela está recordando e sentindo algo que aconteceu há muito tempo, e de que ela está bastante segura com você agora. Apenas continue apoiando e deixe os sentimentos aflorarem. Pode ser mais de um trauma e, por esta razão, visitar os períodos mencionados pode ser de grande valia. Existe um processo de ressuscitar a criança que habita em nós. Que lembranças surgem entre 0 e 5 anos de idade? Não force nada, apenas deixe fluir. Virão imagens, diálogos, cenas que marcaram alguma idade desta fase. Acesse o sentimento da criança dentro de você. Estabeleça confiança, cumprindo promessas não feitas, acolhendo, dedicando atenção que ela pede. Converse com ela e peça para ela vir estar com você. Estabeleça um diálogo entre vocês. Fale que você cresceu e que não vai deixar que ninguém a machuque mais. Deixe as experiências surgirem sem qualquer censura. Depois comece a perdoar. Na madrugada me surgiu uma forma básica, e sei que devem existir outras, cabendo a cada um expressar o que acha melhor. Eu fiz assim: “Eu me perdôo, eu te perdôo; eu me liberto, eu te liberto; eu me amo e eu te amo. Somos um só nesta vivência.”É impressionante como aparece um sentimento confortador. Abrindo mão daquilo que nos preenchia no medo, aparece espaço que é preenchido com o amor. Na verdade, só existem dois sentimentos básicos: amor e não amor, este definindo raiva, ódio, inveja, ciúme e todas as formas não amorosas de se relacionar. Uma vez que os sentimentos negativos saem, vão dando espaço de sobra e a energia natural do amor retorna ao seu lugar. É a luz preenchendo cada cantinho do nosso ser. Fiz isso com cada fase e fui encontrando nos diálogos, os motivos que me aprisionavam. Claro que as dores tinham causa física, mas a forma como estava lidando com ela era emocional e precisava ajustar. Estava presa na tridimencionalidade quando podia saber muito mais sobre mim a partir da 4D. Foi o que fiz. As dores foram cedendo, da mesma forma que o tumor da neurocientista ou da protagonista do filme citado. Não se tratava de expulsar nada, mas aceitar tudo o que me pertencia para chegar ao miolo do meu Self.
Muitos acham que o medo aparece apenas diante de situações ruins. Esperamos o fracasso de algo, temos medo de perder o que gostamos, medo de errar, etc. No entanto, o ruim nós já conhecemos e até aceitamos. O que parece mais meter medo é o sucesso. Tememos ter que mantê-lo e não conseguirmos. Se estamos vivendo algo ruim, o que vier de bom é lucro! Mas se vivemos algo muito bom, tememos perder e aí começa a negação. Eu estava diante de uma experiência há muito desejada, mas desacreditada. Queria viver novamente o amor relacional, mas só tinha encontrado traições, mentiras, egos. Uma semana antes da crise vivida, alguém despertou minha atenção de uma forma bem diferente. Sabia que era alguém especial, de mente aberta e totalmente entregue a seus sentimentos. Foi tão forte que me remeteu aos medos mais embutidos. As dores tomaram um vulto bem maior e depois de aplicar esta técnica em mim mesma, tive “insights” espetaculares. Fiz as pazes com a Tereza criança, a adolescente e a Tereza adulta. Acolhi, ensinei, aprendi, abracei. Foram muitas emoções que vivi nestas madrugadas. Valeu à pena cada segundo!
III.1.Como fazer:
Minha sugestão é viver cada etapa por vez, por uns vinte minutos, no máximo. A respiração precisa ser controlada e uma respiração suave é requerida de forma que você mantenha a calma durante todo o tempo. Minha sugestão é utilizar a “respiração consciente” que quer dizer inspirar e expirar pela boca, sem controlar o ar. Traga toda a sua atenção para esta respiração, enquanto a mente é silenciada. Para facilitar ainda mais, sugiro a técnica do balão: inspire, pela boca, como se você fosse uma bola de inflar, enchendo toda ela, e expire esvaziando-a. Faça isso em alguns segundos, não apenas para relaxar, como também para focar no objetivo. Lembre-se de que a respiração tem ligação com o medo e a produção de pensamentos. Quanto mais calmo é o batimento cardíaco, menos produção do pensamento. Feito isso, comece a técnica. Escreva tudo ou grave a sua experiência, pois vai ser bom revisitá-la no fim. Não tenha pressa em concluir tudo. Cada um tem um tempo certo que lhe é próprio.
III.2.Aplicando a técnica:
Como indivíduo, você é solicitado agora a se abrir para você mesma, retirando todo o juízo de valor. Seu coração, em algum momento, se fechou e não permitiu que você florescesse. Você tem uma história e parte dela lhe prende em algum lugar do passado, impedindo-o de seguir em frente, rumo ao amor. Aprendeu a se julgar e, consequentemente, aos outros. Os conflitos internos gritam e constroem muros, confirmando a solidão e separação aprendidas. É necessário entender que você quer ser acolhido e cabe a você começar este processo. Saiba que uma vez enfrentado o conflito interno, uma transformação surge não só apenas em você, mas também com as pessoas que vivem à sua volta.
Esta técnica vai conectar você com você mesmo. Você vai construir uma nova relação consigo mesmo, mas par isso, terá que enfrentar seus fantasmas. A mente é extremamente limitada, totalmente baseada no medo, impedindo-o de correr riscos. São os sentimentos que o farão curar nos níveis físico, emocional e mental. Eles são a chave para as experiências. Esteja aberto para se permitir receber. O medo aparecerá, tal é o nosso condicionamento. Contudo, saiba que a melhor forma de vencer o medo é justamente o movimento consciente na direção do sentimento e da respiração. Fazendo isso, o medo se dissipa. Ele é apenas um sentimento, não podendo machucá-lo. As feridas precisam ser curadas. As feridas abertas o afastam do amor. A paciência consigo mesmo é uma condição necessária nesta jornada. À medida que for avançando na experiência, você acelerará uma nova consciência de vida.
III.2.a.Fazendo o exercício da respiração:
Para facilitar, imagine-se como uma bola de inflar. A cada inspiração, você aumenta de tamanho, enquanto na expiração, você esvazia. Respire pela boca. Fique assim alguns segundos. Isto vai acalmá-lo, além de trazer o foco para a técnica em questão. Lembre-se de que quanto mais ansiedade, mais batimento cardíaco e mais produção de pensamentos frenéticos em sua mente.
III.2.b.Trabalhando nas faixas etárias:
Para facilitar sua experiência, vamos trabalhar por faixas de idade, indicando o período no qual algumas vivências aconteceram. Sugiro de 0-5; de 5-10; de 10-15, etc, como numa escala de pesquisa. Agora entre em contato com a sua criança interior. Ela guarda os traumas acumulados. Traumas são marcas negativas que aparecem diante de situações de choque, vividas. O problema parece ser um elefante, enquanto você era apenas uma formiga. Essa criança clama para ser acordada e resolver seus conflitos. Que a impediram de criar. Acesse os sentimentos dessa criança dentro de você. Sua jornada para o Self não pode ser concluída sem essa conexão consciente com as partes desintegradas de si mesmo. Ninguém teve uma infância perfeita. Sempre existem coisas que o afetaram e que ainda o afetam até hoje. A cura começa nesse contato entre você e sua criança interior. Quando o medo e a dor são grandes o suficiente par lidar quando somos crianças, as partes infantis se dividem. Uma parece guardar a dor a sete chaves, enquanto a outra permanece no modo “sobrevivência”. O tempo foi interrompido para essa criança e, por isso, ela desconhece o adulto que você se tornou. Você precisa tomar consciência dos incidentes em sua vida que espelhem o trauma que foi tecido. Deixe fluir!
O que lhe vem à cabeça nesse período de 0 à 5 anos? O que você vê e sente? Pode aparecer em sua mente um cheiro, a casa que você passou a infância, uma emoção, uma cena… Você precisa cessar o sentimento dessa criança dentro de você. Uma relação de confiança entre vocês precisa ser construída, cumprindo promessas, estabelecendo diálogos nos quis o que está inacabado precisa ser concluído. Convide-a ao diálogo. Peça para ela vir e que fique com você. Ofereça-lhe apoio, aconchego. Acolha-a sem crítica. Ela tem vivido sozinha todo esse tempo. Fale com ela que você cresceu e que não vai permitir que ninguém mais a machuque. Permita que ela desabafe todas as mágoas. Falar em voz alta é bem interessante para você ouvir você mesma as expressões afetivas que surgem. O simples apoio o fará estabelecer o vínculo com os sentimentos ali presentes. Você vai reviver coisas que não vê há muito tempo. Os sentimentos precisam aflorar. Deixe-os fluir.
Mas você precisa perdoar a si mesmo e à criança que surge. Todos os julgamentos deveriam ser suspensos para que o amor essencial possa fluir. Um muro foi criado, não deixando que outros entrassem em seu mundo, fechando-se para o amor.
Existem várias formas de usar o perdão e você pode ficar à vontade para escolher a forma mais apropriada pra você. Eu usei um jeito simples, surgido em meu coração:
“Eu me perdôo, eu lhe perdôo. Eu me liberto, eu lhe liberto. Eu me amo, eu lhe amo.”
Fale isso várias vezes, até que sinta que surgiu um espaço dentro de você, antes ocupado com o trauma. Costumo dizer que só existem dois tipos de sentimentos: amor e não-amor, este antagônico ao sentimento de união. Deveríamos ser preenchidos apenas com o amor, mas também precisamos conhecer toda a palheta de sentimentos que existem em nosso universo. Uma vez resolvidos, um espaço se abre que é, automaticamente, preenchido com amor. Uma sensação de bem estar aparece, indicando que esta parte foi curada.
Quando seu coração se abre, você começa a ser plenamente capaz de receber em todos os níveis de sua existência. Cada perdão experienciado o levará ao alinhamento com seu verdadeiro eu, liberando o que estava preso e restaurando a sua inata capacidade criativa.
III.2.c.Vamos agora para a próxima etapa. Vamos visitar a faixa de 5 à dez anos. Esta faixa costuma ser mais poderosa, pois a mente já sabe construir suas armadilhas ou sabotagens. Veja o que a sua criança tem a lhe dizer. Divida com ela o que tanto a magoou. Uma vez detectado, faça o perdão. Não basta tomar consciência do que houve; é necessário a libertação e esta só pode ocorrer através do perdão. Perdoando você vai se transformar; sua vida vai se modificar. Você tem o direito de ser amado! É seu direito ser amparado, AGORA! Você pode pensar: “Eu decidi me abrir agora para o meu direito inato de ser amado.”
Um diálogo será formado, exatamente igual à etapa anterior. Você acolherá a sua adolescente machucada dentro de você.
III.2.d.Agora iremos acessar a faixa de 10 à 15 anos. Você já conhece o caminho e já venceu muitas barreiras até agora. Sua adolescente clama pela sua atenção.
Faça isso com todas as etapas, respeitando e tendo paciência com você e com a sua parte afetada
negligenciada de si.
IV.Conclusões:
Estudiosos da criatura humana, libertando-se dos controles das teses freudianas, ampliaram os horizontes de compreensão em torno de complexos fenômenos, capazes de elucidar problemas profundos de personalidade. Muitos espaços foram abertos na formulação de conceitos que nos libertam dos paradigmas acadêmicos. Corajosos companheiros de jornada se preocuparam em ir além dos padrões estabelecidos. As teorias que pretendiam reduzir a consciência intuitiva a um epifenômeno de vida efêmera foram sendo superados por pesquisas científicas, nas áreas da neurociência, psicofísica, campos eletromagnéticos e outros, ampliando assim nosso esquema de interpretação.
Os avanços da teoria quântica, a relatividade do tempo e do espaço, abriram caminho para perspectivas psicológicas antes sequer sonhadas, tendo em vista o conceito de vir-a-ser. A vida é uma passagem da desarmonia para a harmonia, da desordem para a ordem, da multiplicidade para a unidade. A Psicologia persegue este objetivo levando o homem a reencontrar o seu verdadeiro Self, caminho da integração de si mesmo. Esta tarefa grandiosa cabe à moderna Psicologia e aos seus corajosos pesquisadores, que inicia um período de real compreensão da criatura como ser indestrutível, fadado à felicidade.
Esta técnica constitui uma forma auxiliar de fazer a pessoa ter um encontro consigo mesma e poder “curar” as partes desintegradas de si mesmo. Uma viagem que pode ser dolorosa no início, mas que restaura o amor inerente em cada um de nós. O que posso desejar aqueles que a farão, é uma boa jornada, com confiança de que vocês farão parte da construção de um mundo melhor, uma vez que a sua cura abrange em muito a cura de todos à sua volta. Mãos à obra! Já não há mais tempo para delongas. O mundo precisa de uma faxina e esta terá que começar por nós mesmos.
Deixo, desde já, o meu amor para aqueles que enfrentam, ou estão enfrentando, as suas verdades. Deixo o meu conforto e acolhimento, pois compreendo a luta, mas também percebo e assisto a vitória. Seja bem vindo ao mundo dos inquietos, dos que querem ousar mudar o mundo!

Gostaria de dedicar este trabalho a duas pessoas que me inspiraram e estiveram comigo durante todo o percurso: Dr. Sérgio Henrique Garcia, meu osteopata, que identificou o nódulo de dor e o associou a alguma experiência dolorosa, graças a seu método revolucionário de trabalhar as criaturas; e ao Micheal, que despertou em mim novamente o verdadeiro amor, me acompanhando, mesmo de longe, em todas as madrugadas, com suas palavras amorosas. Desejo, a estes dois seres iluminados, muita Luz para poder iluminar mais ainda aqueles que vivem na escuridão. A vocês, meu muito obrigada.
Desenvolvimento da técnica “Fazendo as pazes com o seu passado”
Tereza Erthal
I.Introdução:
Aquilo que nos fez sofrer no passado, pode se arrastar no presente e atravancar nosso progresso futuro. É como se a perpetuação dessa sofreguidão criasse uma rede onde tudo convergisse para a nossa dor. Ressentimentos impedem de vermos os prazeres da vida e as dores da alma vão se localizando no corpo e deixando suas marcas através da doença. Isto não significa que o passado nos determina, mas que o passado inacabado, torna-se sempre presente, atuando sobre nós como uma influência nefasta. É mister tomarmos consciência disso para que possamos agir em nosso proveito.
Tem sido provado que a capacidade de desenvolver o perdão faz com que as pessoas vivam bem mais e com mais qualidade de vida. Mas o problema em perdoar está em confundir o perdão com conciliação ou aproximação como velhos amigos, quando a pessoa a ser perdoada era um algoz. Mas não se trata de fazer as pazes com ela e esquecer o que foi feito. O que o perdão significa é um novo olhar para a situação, uma ressignificação. A situação é vista de uma nova forma. O passado factual não pode ser mudado, mas quando damos um novo significado a ele, tudo muda. Libertamos a pessoa e a nossa parte na história. A libertação, através do perdão, ocupou um lugar importante n ciência, embora alguns ainda a vêem pelo aspecto religioso. Muitas doenças já foram estudadas ( alergias, problemas cardiovasculares, gastrites, fibromialgia, lombalgia, enxaquecas e outros), indicando que elas são o resultado de algo inacabado que grita por atenção. Estudos vem colaborar para essas afirmações- Hope College, em Michigan, pela psicóloga Charlotte Van Oyen Witvliet, Stanford com Fred Luskin que criou um projeto para o perdão, Robert Enright da Universidade de Minessota que criou o Instituto Internacional do perdão…, são alguns exemplos desse avanço. Existe um poder terapêutico no perdão.
“Não perdoar é como pegar um carvão em brasa para jogar no outro: você, com certeza, será queimado.” Buda
Portanto, nesse trabalho, estamos focados na libertação de parte do eu que ficou aprisionado num passado doloroso. Trazemos este passado para o agora e ressignificamos as partes. O perdão parece finalizar a compreensão, alterando o presente. Como Sartre nos disse, chega a hora em que temos que escolher entre dois caminhos: ou continuamos continuadores passivos da nossa história, ou a ultrapassamos, criando o nosso próprio roteiro. Qual seria a sua escolha?

II. Compreendendo a relação da consciência com as doenças:
Experienciamos o mundo através da consciência. Trata-se de um estado de captação que nos leva a agir de uma forma peculiar. Na tentativa de preencher o seu vazio, a consciência se volta para os fenômenos do mundo através dos sentidos. Pode captar o fenômeno pela imaginação, pela audição, visão, etc. Também sabemos que existem várias formas de consciência. Sartre definia dois modos de consciência ( irreflexiva e reflexiva), bem definidas por Descartes. A primeira é irracional, passiva, irreflexiva e, portanto, sem qualquer julgamento sobre o que é percebido. Digamos que podemos entendê-la agora como um modo que inclua o que é instintual, isto é, um modo de consciência mais baixo, ligado às sensações. Na consciência de segundo grau ou reflexiva, já existe um eu que reflete e julga. Nesses casos, as atividades mentais são necessárias para que ela possa existir. Por mente denomino o conjunto das faculdades intelectivas do homem, a função da personalidade que Jung chama de pensamento e os psicólogos denominam intelecto. A mente dá ao homem o poder de pensar, raciocinar e tomar conhecimento do que é percebido por meio dos sentidos. É o que dá ao homem a condição de ser consciente de si. A mente é impedida de ser a grande mediadora entre o mundo subjetivo e o mundo objetivo, porque é o único aspecto da personalidade que tem uma natureza dupla: o pensamento concreto e o pensamento abstrato. Entretanto, o homem, na maioria dos casos, usa apenas a parte exterior da mente, desenvolvendo a mente o pensamento concreto, que o impede de perceber as idéias intuitivas. Em um patamar mais alto estaria a mente abstrata, com suas análises e reflexões abrangentes, descentralizadas. Entre as duas parece existir um outro modo de consciência, a emocional, que em vez da forma de captação da realidade se processar apenas pelos cinco sentidos, constitui outra forma de apreensão. Se a primeira é irreflexiva, a segunda poderia ser vista como pré-reflexiva, indicando que nela existe a capacidade potencial de reflexão. Esta consciência emocional pode variar entre a impulsividade, apegos e sentimentos menos elaborados de um lado, até as aspirações mais altas e sentimentos elevados, buscando o bem geral, de outro. O homem emocionalmente maduro possui a capacidade de identificação, empatia ou faculdade de dar. Aprende a superar o egoísmo, os apegos e toda a forma de possessividade, subestimando-os pelo amor altruístico e incondicional.
Assim, podemos falar que existem quatro modos de consciência: sensorial, emocional, mental e espiritual ou consciência intuitiva. As três primeiras, quando integradas, levam ao desenvolvimento da autoconsciência, próprio da personalidade que aprendeu a se conhecer, a cultivar atitudes que lhe faltam, a construir um caráter. A autoconsciência evolui para uma consciência intuitiva ou espiritual, em que há uma transferência da consciência pessoal para a impessoal, na qual há equanimidade ( não há predomínio nem do prazer, nem da dor),em que há o cultivo de felicidade pela confiança interna, em que a paz transcende à racionalização. É pela intuição que tocamos na esfera superior e compreendemos o sentido.
O mundo da intuição é o mundo do significante e do significado. Se a mente nos ajuda a compreender o significado da origem dos acontecimentos, a intuição nos devolve a compreensão das finalidades. No modo intuitivo de consciência há sensibilidade quanto às possibilidades novas que as coisas possam oferecer. Na passagem da consciência mental para a intuitiva ocorre o sofrimento decorrente da separação temporal que tem de passar para transcender. O recolhimento vira uma busca, não como fuga, mas como um sentido. É neste ponto que o homem descobre não estar sozinho. A consciência intuitiva é, na verdade, uma consciência grupal, na qual o homem se percebe fazendo parte de um todo. É a verdadeira consciência, da qual as outras são apenas reflexos imperfeitos. A “ voz da consciência” é uma voz transcendente. É ela quem indica o sentido, tantas vezes procurado e vivido como vazio.
Se ficarmos no plano ôntico, da imanência psicológica ou a esfera circunscrita da pessoa, a consciência intuitiva não pode ser analisada. No entanto, assim que nos transpusermos para uma dimensão ontológica, ela deixa de ser problema, passando a ser um elemento existencial, um atributo da existência humana. Vemo-nos jogados em um mundo no qual os objetos parecem brilhar, como se fossem iluminados por dentro. Essa luz é o “insight”. Inspirar é levar o ar pra dentro, um fluir natural dos sentimentos, através da mente.
A busca para atingir esse modo de consciência é longa e dolorosa. Exige disciplina, intenção e uma crença inabalável na direção pretendida. Quando a consciência espiritual é tocada, dois fenômenos da consciência ocorrem: amor e arte. No caminho para o amor, a inspiração cresce; no caminho para a arte, nasce a criação.
Pelo que já foi dito, podemos dizer que vivemos numa consciência tridimensional onde há uma forte crença nas limitações e deficiências colocadas nas pessoas e nas condições do meio. Uma luta enorme é travada, permeada por um profundo medo, originando um extremo cansaço que permeia as sociedades. A grande maioria das pessoas não está em contato com as suas habilidades, isto é, a sua capacidade natural e ilimitada de criar. Vive-se a ilusão de estar sozinho e separado, sem apreciar a singularidade individual do Universo. O tempo é a maior ilusão e, como uma teia, prende os desavisados.
Mas a consciência tem evoluído para a 4D, que nos leva a sentir que fazemos parte de algo maior que nós. Não há sensação de estar só. O que existe é uma consciência das energias ao redor e o indivíduo se abre para o apoio que existe à sua disposição. Começa a entender e vivenciar o seu lugar dentro de algo bem maior (Consciência Universal) e experienciar uma orientação mais intuitiva.
A consciência 5D passa por um estado de Amor incondicional, um estado de unidade com toda a consciência de vida, uma experiência direta de ser uno com a Consciência Universal, além de um alinhamento consciente com o amor puro de sua essência.
Passar de um estado de consciência 3D para uma de 4D ou 5D é excitante e tem um grande papel na transformação. Quando se toma a atitude de dar início ao despertar, você começa a assumir o seu lugar na vida. O estar desperto leva a um estado diferente de consciência (vibração diferente das células). É a frequência do amor que não apenas nos muda, como afeta as pessoas à nossa volta e todas as coisas vivas. As mudanças que virão, exigirão que você esteja mais consciente do papel que representa agora.
Em função de tudo isso, desenvolvi uma técnica capaz de acessar o modo de consciência que ficamos presos no passado. Este aprisionamento se deve a alguma experiência traumática que fomos submetidos e, sem capacidade de transcender a dor, empurramos para debaixo do tapete ou fingimos que nada aconteceu. Desta forma, a experiência passa desapercebida ( atitude de má fé sartriana), mas não as dores que foram geradas e que ainda permanecem. A impressão é de que estamos sendo atacados, que esta dor não nos pertence, que a vida está sendo injusta. Contudo, estas dores somos nós gritando em algum lugar do passado/presente, querendo a atenção para poder partir.
Passei isso há algumas semanas atrás. Tive um problema na lombar que evoluiu para dores na ciática. Que dores fortes! Em muitos momentos desejei a morte, pois não conseguia dormir (ficar deitada era impossível) ou sentar para ler ou algo assim. As dores dilacerantes me faziam ficar acordada por toda a noite, andando pela casa, já que apenas andando dava um pequeno alívio. Chorava, brigava com Deus, tinha raiva. Nada adiantava, nem mesmo todo o tratamento medicamentoso e fisioterápico. Parecia que eu estava abandonada e que nada iria acabar com o meu sofrimento. Lembrei-me de um filme de nome “ A Guitarra”, de origem argentina, no qual a protagonista, em um só tempo, descobre um câncer terminal, perde o noivo e o emprego, no dia da revelação. Desesperada e sem rumo, retira todo o seu dinheiro e começa uma jornada de coisas que sempre quis e não podia possuir, e passa a viver o momento presente apenas. Viver o agora na sua mais concreta forma. Depois de tantas experiências, descobre que já se passaram dois meses e nada tinha acontecido à sua saúde. Visitando os médicos, descobre que o mal que a invadia, havia desaparecido. Questionando o porquê, foi-lhe dito que o mal que nos acomete tem um meio propício pra se alimentar. Quando mudamos este meio, o tumor se sente fora do “habitat” que o construiu e perde suas forças.
Outro exemplo que me ajudou foi a palestra de uma neurocientista, há uns anos atrás, que foi acometida de um derrame poucos minutos antes de sair de casa para o hospital em que trabalhava. Sabendo que o tumor que mantinha no cérebro era inoperável, primeiro se desesperou. Mais tarde, vendo que o desespero em nada contribuía para um estado melhor, começou a conversar com ele, baseada no fato de que se construiu, esta coisa lhe pertence, faz parte de si. Diariamente, estabelecia um diálogo com ele da seguinte maneira: “ sei que fui eu quem o criou; sei que você não é um invasor como supunha; você faz parte de mim. Portanto, precisamos fazer as pazes e conviver da melhor forma. Seja bem vindo! Estamos no mesmo barco. Não pretendo lhe expulsar, mas aceitá-lo como é. Se eu o fiz, cabe a mim entender e perdoar a você e a mim mesma por esta etapa.” E o diálogo ia ficando mais íntimo entre eles. O resultado? O tumor sumiu! O que o fez desaparecer? O meio no qual foi construído era diferente do meio no qual estava sendo compreendido. Exatamente igual a experiência do filme, também verídica.
Pensando em tudo isso, e com todo o tempo do mundo na madrugada, achei por bem entender o que a dor queria significar. Se antes brigava e sofria ainda mais, agora tinha jogado a toalha e iria tentar me harmonizar com tudo. Comecei estabelecendo um diálogo com a dor; ela me sinalizava algo que não sabia. Havia algum medo ali que precisava descobrir. Vi que estava completamente sozinha, física e emocionalmente. Era uma sensação bastante dolorosa, mas continuei. Pretendia partir de um lugar de desespero para chegar a um lugar de cura física e emocional. Sabia que a melhor maneira de vencer o medo era o movimento consciente na direção do sentimento e da respiração. Fiquei consciente do sentimento de medo, à medida que avançava. Quando fazemos isso, o medo se dissipa. O medo não pode nos machucar. É somente um sentimento criado por nós diante da baixa estima que desenvolvemos.
Há feridas que carregamos no coração que precisam ser curadas. Muitas destas feridas estão conosco há muitos anos. As feridas abertas nos mantém separados do amor que é direito nosso vivenciar nesta vida. A abertura para este novo aspecto do amor produz em si a cura e uma nova sensação de bem estar dentro de nós.
Aprendi que era preciso ser paciente comigo mesma enquanto empreendia esta jornada. Cada experiência que eu fiz neste período serviu para eu estreitar meus laços comigo mesma. Tais alinhamentos me ajudaram a desenvolver-me no meu Self e acelerar a nova consciência da vida e verdade. Deste contato íntimo com as minhas dores e medos, entendi que precisava de um método para eu não me perder na experiência. Depois de estabelecer este contato com a dor, comecei a entender que estava passando por uma revolução emocional e precisava saber quais fases da minha vida eu teria ficado presa em alguma sensação. Comecei a técnica…
III.A técnica propriamente dita:
Em primeiro lugar, achei por bem visitar todas as minhas idades e a dividi em períodos de cinco em cinco anos (0-5;5-10;10-15,etc). A cada etapa, deixava minha mente livre pra seguir as emoções que acompanhavam as lembranças engavetadas. E, claro, elas existiam. Não se trata de recalque, como Freud nos disse. Acredito que o homem é um ser autoconsciente, capaz de tomar consciência de si, seja qual for o problema enfrentado. O que ele precisa é disciplina e vontade, sem julgar nada do que for ver.
A nossa história pode nos ajudar a dar os primeiros passos em nossa jornada, mas chega o momento em que nós temos que deixar a história pra trás. A cura somente pode ser alcançada se for descolada da história. É preciso deixar de ser vítima para assumir a responsabilidade pelo papel representado para ter a experiência. Identificamo-nos com a nossa história, mas somos muito mais do que ela. É preciso coragem pra abrir mão da história e dar um salto em direção ao Self. Precisamos deixar a história limitada tridimencional, que acreditamos ser por pura autossabotagem ou má fé, para atingir a verdadeira liberdade dentro de nós. O processo de autocura é amor, paciência e compaixão por nós mesmos. Devemos ter paciência com os erros que cometemos e perdoarmos enquanto vivemos o nosso dia a dia.
Primeiro devemos mudar conscientemente e estar dispostos a participar das mudanças dentro de nós. Temos que entrar em contato com a nossa criança interior, presa no emaranhado de sentimentos por nós traçados. Esta criança interior guarda os traumas das vivências passadas. Quando apoiar a criança, você vai começar a se conectar com todos os sentimentos que estão ali. Alguns destes sentimentos são profundos. Permita-se sentir e lembrá-lo do que ela está recordando e sentindo algo que aconteceu há muito tempo, e de que ela está bastante segura com você agora. Apenas continue apoiando e deixe os sentimentos aflorarem. Pode ser mais de um trauma e, por esta razão, visitar os períodos mencionados pode ser de grande valia. Existe um processo de ressuscitar a criança que habita em nós. Que lembranças surgem entre 0 e 5 anos de idade? Não force nada, apenas deixe fluir. Virão imagens, diálogos, cenas que marcaram alguma idade desta fase. Acesse o sentimento da criança dentro de você. Estabeleça confiança, cumprindo promessas não feitas, acolhendo, dedicando atenção que ela pede. Converse com ela e peça para ela vir estar com você. Estabeleça um diálogo entre vocês. Fale que você cresceu e que não vai deixar que ninguém a machuque mais. Deixe as experiências surgirem sem qualquer censura. Depois comece a perdoar. Na madrugada me surgiu uma forma básica, e sei que devem existir outras, cabendo a cada um expressar o que acha melhor. Eu fiz assim: “Eu me perdôo, eu te perdôo; eu me liberto, eu te liberto; eu me amo e eu te amo. Somos um só nesta vivência.”É impressionante como aparece um sentimento confortador. Abrindo mão daquilo que nos preenchia no medo, aparece espaço que é preenchido com o amor. Na verdade, só existem dois sentimentos básicos: amor e não amor, este definindo raiva, ódio, inveja, ciúme e todas as formas não amorosas de se relacionar. Uma vez que os sentimentos negativos saem, vão dando espaço de sobra e a energia natural do amor retorna ao seu lugar. É a luz preenchendo cada cantinho do nosso ser. Fiz isso com cada fase e fui encontrando nos diálogos, os motivos que me aprisionavam. Claro que as dores tinham causa física, mas a forma como estava lidando com ela era emocional e precisava ajustar. Estava presa na tridimencionalidade quando podia saber muito mais sobre mim a partir da 4D. Foi o que fiz. As dores foram cedendo, da mesma forma que o tumor da neurocientista ou da protagonista do filme citado. Não se tratava de expulsar nada, mas aceitar tudo o que me pertencia para chegar ao miolo do meu Self.
Muitos acham que o medo aparece apenas diante de situações ruins. Esperamos o fracasso de algo, temos medo de perder o que gostamos, medo de errar, etc. No entanto, o ruim nós já conhecemos e até aceitamos. O que parece mais meter medo é o sucesso. Tememos ter que mantê-lo e não conseguirmos. Se estamos vivendo algo ruim, o que vier de bom é lucro! Mas se vivemos algo muito bom, tememos perder e aí começa a negação. Eu estava diante de uma experiência há muito desejada, mas desacreditada. Queria viver novamente o amor relacional, mas só tinha encontrado traições, mentiras, egos. Uma semana antes da crise vivida, alguém despertou minha atenção de uma forma bem diferente. Sabia que era alguém especial, de mente aberta e totalmente entregue a seus sentimentos. Foi tão forte que me remeteu aos medos mais embutidos. As dores tomaram um vulto bem maior e depois de aplicar esta técnica em mim mesma, tive “insights” espetaculares. Fiz as pazes com a Tereza criança, a adolescente e a Tereza adulta. Acolhi, ensinei, aprendi, abracei. Foram muitas emoções que vivi nestas madrugadas. Valeu à pena cada segundo!
III.1.Como fazer:
Minha sugestão é viver cada etapa por vez, por uns vinte minutos, no máximo. A respiração precisa ser controlada e uma respiração suave é requerida de forma que você mantenha a calma durante todo o tempo. Minha sugestão é utilizar a “respiração consciente” que quer dizer inspirar e expirar pela boca, sem controlar o ar. Traga toda a sua atenção para esta respiração, enquanto a mente é silenciada. Para facilitar ainda mais, sugiro a técnica do balão: inspire, pela boca, como se você fosse uma bola de inflar, enchendo toda ela, e expire esvaziando-a. Faça isso em alguns segundos, não apenas para relaxar, como também para focar no objetivo. Lembre-se de que a respiração tem ligação com o medo e a produção de pensamentos. Quanto mais calmo é o batimento cardíaco, menos produção do pensamento. Feito isso, comece a técnica. Escreva tudo ou grave a sua experiência, pois vai ser bom revisitá-la no fim. Não tenha pressa em concluir tudo. Cada um tem um tempo certo que lhe é próprio.
III.2.Aplicando a técnica:
Como indivíduo, você é solicitado agora a se abrir para você mesma, retirando todo o juízo de valor. Seu coração, em algum momento, se fechou e não permitiu que você florescesse. Você tem uma história e parte dela lhe prende em algum lugar do passado, impedindo-o de seguir em frente, rumo ao amor. Aprendeu a se julgar e, consequentemente, aos outros. Os conflitos internos gritam e constroem muros, confirmando a solidão e separação aprendidas. É necessário entender que você quer ser acolhido e cabe a você começar este processo. Saiba que uma vez enfrentado o conflito interno, uma transformação surge não só apenas em você, mas também com as pessoas que vivem à sua volta.
Esta técnica vai conectar você com você mesmo. Você vai construir uma nova relação consigo mesmo, mas par isso, terá que enfrentar seus fantasmas. A mente é extremamente limitada, totalmente baseada no medo, impedindo-o de correr riscos. São os sentimentos que o farão curar nos níveis físico, emocional e mental. Eles são a chave para as experiências. Esteja aberto para se permitir receber. O medo aparecerá, tal é o nosso condicionamento. Contudo, saiba que a melhor forma de vencer o medo é justamente o movimento consciente na direção do sentimento e da respiração. Fazendo isso, o medo se dissipa. Ele é apenas um sentimento, não podendo machucá-lo. As feridas precisam ser curadas. As feridas abertas o afastam do amor. A paciência consigo mesmo é uma condição necessária nesta jornada. À medida que for avançando na experiência, você acelerará uma nova consciência de vida.
III.2.a.Fazendo o exercício da respiração:
Para facilitar, imagine-se como uma bola de inflar. A cada inspiração, você aumenta de tamanho, enquanto na expiração, você esvazia. Respire pela boca. Fique assim alguns segundos. Isto vai acalmá-lo, além de trazer o foco para a técnica em questão. Lembre-se de que quanto mais ansiedade, mais batimento cardíaco e mais produção de pensamentos frenéticos em sua mente.
III.2.b.Trabalhando nas faixas etárias:
Para facilitar sua experiência, vamos trabalhar por faixas de idade, indicando o período no qual algumas vivências aconteceram. Sugiro de 0-5; de 5-10; de 10-15, etc, como numa escala de pesquisa. Agora entre em contato com a sua criança interior. Ela guarda os traumas acumulados. Traumas são marcas negativas que aparecem diante de situações de choque, vividas. O problema parece ser um elefante, enquanto você era apenas uma formiga. Essa criança clama para ser acordada e resolver seus conflitos. Que a impediram de criar. Acesse os sentimentos dessa criança dentro de você. Sua jornada para o Self não pode ser concluída sem essa conexão consciente com as partes desintegradas de si mesmo. Ninguém teve uma infância perfeita. Sempre existem coisas que o afetaram e que ainda o afetam até hoje. A cura começa nesse contato entre você e sua criança interior. Quando o medo e a dor são grandes o suficiente par lidar quando somos crianças, as partes infantis se dividem. Uma parece guardar a dor a sete chaves, enquanto a outra permanece no modo “sobrevivência”. O tempo foi interrompido para essa criança e, por isso, ela desconhece o adulto que você se tornou. Você precisa tomar consciência dos incidentes em sua vida que espelhem o trauma que foi tecido. Deixe fluir!
O que lhe vem à cabeça nesse período de 0 à 5 anos? O que você vê e sente? Pode aparecer em sua mente um cheiro, a casa que você passou a infância, uma emoção, uma cena… Você precisa cessar o sentimento dessa criança dentro de você. Uma relação de confiança entre vocês precisa ser construída, cumprindo promessas, estabelecendo diálogos nos quis o que está inacabado precisa ser concluído. Convide-a ao diálogo. Peça para ela vir e que fique com você. Ofereça-lhe apoio, aconchego. Acolha-a sem crítica. Ela tem vivido sozinha todo esse tempo. Fale com ela que você cresceu e que não vai permitir que ninguém mais a machuque. Permita que ela desabafe todas as mágoas. Falar em voz alta é bem interessante para você ouvir você mesma as expressões afetivas que surgem. O simples apoio o fará estabelecer o vínculo com os sentimentos ali presentes. Você vai reviver coisas que não vê há muito tempo. Os sentimentos precisam aflorar. Deixe-os fluir.
Mas você precisa perdoar a si mesmo e à criança que surge. Todos os julgamentos deveriam ser suspensos para que o amor essencial possa fluir. Um muro foi criado, não deixando que outros entrassem em seu mundo, fechando-se para o amor.
Existem várias formas de usar o perdão e você pode ficar à vontade para escolher a forma mais apropriada pra você. Eu usei um jeito simples, surgido em meu coração:
“Eu me perdôo, eu lhe perdôo. Eu me liberto, eu lhe liberto. Eu me amo, eu lhe amo.”
Fale isso várias vezes, até que sinta que surgiu um espaço dentro de você, antes ocupado com o trauma. Costumo dizer que só existem dois tipos de sentimentos: amor e não-amor, este antagônico ao sentimento de união. Deveríamos ser preenchidos apenas com o amor, mas também precisamos conhecer toda a palheta de sentimentos que existem em nosso universo. Uma vez resolvidos, um espaço se abre que é, automaticamente, preenchido com amor. Uma sensação de bem estar aparece, indicando que esta parte foi curada.
Quando seu coração se abre, você começa a ser plenamente capaz de receber em todos os níveis de sua existência. Cada perdão experienciado o levará ao alinhamento com seu verdadeiro eu, liberando o que estava preso e restaurando a sua inata capacidade criativa.
III.2.c.Vamos agora para a próxima etapa. Vamos visitar a faixa de 5 à dez anos. Esta faixa costuma ser mais poderosa, pois a mente já sabe construir suas armadilhas ou sabotagens. Veja o que a sua criança tem a lhe dizer. Divida com ela o que tanto a magoou. Uma vez detectado, faça o perdão. Não basta tomar consciência do que houve; é necessário a libertação e esta só pode ocorrer através do perdão. Perdoando você vai se transformar; sua vida vai se modificar. Você tem o direito de ser amado! É seu direito ser amparado, AGORA! Você pode pensar: “Eu decidi me abrir agora para o meu direito inato de ser amado.”
Um diálogo será formado, exatamente igual à etapa anterior. Você acolherá a sua adolescente machucada dentro de você.
III.2.d.Agora iremos acessar a faixa de 10 à 15 anos. Você já conhece o caminho e já venceu muitas barreiras até agora. Sua adolescente clama pela sua atenção.
Faça isso com todas as etapas, respeitando e tendo paciência com você e com a sua parte afetada
negligenciada de si.
IV.Conclusões:
Estudiosos da criatura humana, libertando-se dos controles das teses freudianas, ampliaram os horizontes de compreensão em torno de complexos fenômenos, capazes de elucidar problemas profundos de personalidade. Muitos espaços foram abertos na formulação de conceitos que nos libertam dos paradigmas acadêmicos. Corajosos companheiros de jornada se preocuparam em ir além dos padrões estabelecidos. As teorias que pretendiam reduzir a consciência intuitiva a um epifenômeno de vida efêmera foram sendo superados por pesquisas científicas, nas áreas da neurociência, psicofísica, campos eletromagnéticos e outros, ampliando assim nosso esquema de interpretação.
Os avanços da teoria quântica, a relatividade do tempo e do espaço, abriram caminho para perspectivas psicológicas antes sequer sonhadas, tendo em vista o conceito de vir-a-ser. A vida é uma passagem da desarmonia para a harmonia, da desordem para a ordem, da multiplicidade para a unidade. A Psicologia persegue este objetivo levando o homem a reencontrar o seu verdadeiro Self, caminho da integração de si mesmo. Esta tarefa grandiosa cabe à moderna Psicologia e aos seus corajosos pesquisadores, que inicia um período de real compreensão da criatura como ser indestrutível, fadado à felicidade.
Esta técnica constitui uma forma auxiliar de fazer a pessoa ter um encontro consigo mesma e poder “curar” as partes desintegradas de si mesmo. Uma viagem que pode ser dolorosa no início, mas que restaura o amor inerente em cada um de nós. O que posso desejar aqueles que a farão, é uma boa jornada, com confiança de que vocês farão parte da construção de um mundo melhor, uma vez que a sua cura abrange em muito a cura de todos à sua volta. Mãos à obra! Já não há mais tempo para delongas. O mundo precisa de uma faxina e esta terá que começar por nós mesmos.
Deixo, desde já, o meu amor para aqueles que enfrentam, ou estão enfrentando, as suas verdades. Deixo o meu conforto e acolhimento, pois compreendo a luta, mas também percebo e assisto a vitória. Seja bem vindo ao mundo dos inquietos, dos que querem ousar mudar o mundo!

Gostaria de dedicar este trabalho a duas pessoas que me inspiraram e estiveram comigo durante todo o percurso: Dr. Sérgio Henrique Garcia, meu osteopata, que identificou o nódulo de dor e o associou a alguma experiência dolorosa, graças a seu método revolucionário de trabalhar as criaturas; e ao Micheal, que despertou em mim novamente o verdadeiro amor, me acompanhando, mesmo de longe, em todas as madrugadas, com suas palavras amorosas. Desejo, a estes dois seres iluminados, muita Luz para poder iluminar mais ainda aqueles que vivem na escuridão. A vocês, meu muito obrigada.

A apreciação da arte e da beleza
Tereza Erthal

A área de atuação da estética mostra-se bem ampla, pois abarca a produção do belo, tanto na natureza quanto na arte. Mas, o território da estética é particularmente problemático pelo fato de seu objeto não ser definido com muita clareza. Deve-se limitar ao campo da arte ou abranger também a beleza natural? Cabem-lhes vivências muito diversas.
Quais os fundamentos que regem o belo e a arte? A situação do homem aponta o enraizamento na singularidade da vida e na sua historicidade. O homem tem um modo próprio de participar da realidade e é este modo peculiar que se manifesta na arte e na sua compreensão da beleza. A arte e a beleza, se não forem autênticas, isto é, se repetidas e vazias, podem parecer robotizadas. A nova geração se interessa por arte, de fato? Consegue identificar realmente o que seria o belo? O adolescente está muitas vezes mais à vontade diante da tela do computador do que com um livro entre as mãos. Esta tem sido a sua linguagem. Ora, o ser humano é criativo desde a mais tenra idade, independente do setor de atividade que se propõe a criar. Cabe a ele pensar ininterruptamente nas suas múltiplas implicações e nas variadas modalidades de desdobramento. Pela criatividade, cabe a ele acrescentar ao mundo o que a natureza, por si mesma, não lhe fornece. Cria aquilo que precisa sem qualquer potencialidade embutida.
Preferir o belo ao feio passou a fazer parte da condição humana, tão natural quanto a busca da saúde ou a evitação da doença. Isto não impede que o feio possa comparecer na arte. Entretanto, hoje, ao ouvirmos segmentos da cultura se posicionando a favor de uma maior amplitude do conceito de arte, anulam-se os processos qualitativos, na medida em que, simplesmente, considera-se que tudo seja arte ou que tudo seja belo. Parece uma justificativa, como defesa em causa própria, dos falsos artistas que parecem querer apenas se beneficiar por ela. A sociedade está em crise, vivendo uma espécie de autoengano, por simplesmente negar os critérios que distinguem o artístico do não artístico. Numa sociedade na qual os indivíduos precisam reagir da mesma maneira, o não cumprimento disso leva a pessoa a não corresponder à expectativa dos que a cercam, fato que demonstra o aniquilamento do pensamento independente. E, sem a consciência disso, a pessoa imagina-se livre em sua criação. Embora livre em condição, o arbítrio humano é facilmente manipulável pelos que tem o dom da persuasão.
Sabemos que os valores tendem a ser modificados de uma época para outra. Onde um indivíduo vê o belo, outro talvez o enxergue como feio. E o mesmo homem pode modificar seu juízo estético, vindo a apreciar o que antes repudiava. A vivência estética é tingida de subjetividade e de oscilação valorativa. Assim, o feio desfruta de um grau de legitimidade tão espontâneo quanto o belo. E qual seria o critério deste valor? Na contemporaneidade o que parece predominar é a utilidade como referencial comparativo. Cada vez mais o homem é mensurado a partir de sua utilidade. Cada cultura cristaliza uma espécie de hierarquia de valores e é desta forma que constrói a sua própria coesão. Na Idade Média, por exemplo, o assunto básico na arte era o religioso. A Virgem Maria constituiu a transmissão máxima da beleza possível da mulher.
É possível que o plano estético se choque com o da lógica, já que está em constante contato com a beleza. É possível que nossa apreciação pelo belo seja embotada pela acomodação pessoal, uma espécie de conformismo aos ditadores do consumo. A mídia conduz ao anestesiamento do senso crítico, na maior parte das vezes. Então a arte está ausente de critério? A própria escolha pela ausência de critério não deixa de ser uma forma de critério. O belo e o artístico pertencem à categoria do “ bem feito” .A arte seria bem feita se a obra obedecesse às intenções do seu autor. Comandado por uma massa generalizada, abriria espaço para o que se chamaria de imperfeição. O indivíduo anular-se-ia perante uma coletividade que tudo assimila e ao mesmo tempo determina, abdicando de sua singularidade.
Embora a arte e a beleza careçam de definições unívocas, isto não autoriza uma definição particular de cada um. Ao dizer que tudo é arte e tudo é belo, seria o mesmo que dizer que nada é belo ou é arte, pois são vazias de sentido. A experiência estética não é mera fantasia; é requerido, ao contrário, lucidez para a apreensão da beleza. A dimensão social, o movimento da história e a própria subjetividade devem ser consideradas na compreensão de uma obra de arte.
O gosto estético deve ser descrito de dois modos: empírico subjetivo e conceitual objetivo. Embora participe dos dois, não se funde a nenhum deles. A beleza pertence ao rol das qualidades, uma exigência do humano. Tomando a compreensão estética como traço da condição humana, ou seja, algo desenvolvido, precisamos realçar a existência em sua forma valorativa, sempre destinada a se modificar de acordo com o contexto histórico. Veja o conceito de genialidade, por exemplo. A genialidade não é democrática, mas se restringe a pouquíssimos escolhidos. Nem sempre uma sociedade reconhece um gênio, dando-lhe o real valor. O gênio de Proust, entre outros, é a totalidade de suas obras, não algo inato, como alguns acreditam. Sua genialidade repousa no esforço desenvolvido em cada texto criado por ele. Nada lhe foi dado de forma gratuita. E o contra senso é demonstrado no fato de que a mesma terra que gerou artistas como Rembrandt e Van Gogh, também produziu o Big Brother! O pior pecado da cultura é a mediocridade.
As coisas não são nem boas ou ruins em si mesmas, como muitos querem acreditar. Tudo vai depender do uso que dela se faz. A cultura ocidental, que mesmo antes da globalização já havia se tornado ampla em sua magnitude, está em crise. Cada vez mais as culturas tendem a se igualar, moldadas pelos padrões vindos da cultura de massa. É uma crise de sentido! O exótico passa a ser incluído na dignidade da norma.
É necessário resgatar a singularidade existente em todos nós. Somos criadores de nós mesmos e, por isso, somos a nossa principal obra de arte! Talvez seja preciso reeducar o nosso olhar para, a partir dele, enxergar a verdadeira realidade em toda a sua tonalidade, assumindo a responsabilidade da escolha consciente.

Corações partidos

Fui convidada para discorrer sobre o tema “corações partidos”, mas minhas idéias não foram bem apresentadas, de forma que decidi expô-las aqui, aos interessados no tema. O interesse era enumerar as possíveis saídas para as pessoas que vivem a dor da separação e não conseguem curá-la. Antes, porém, de focar nas práticas de solução, precisamos entender como o problema se forma.
A dor do coração partido é uma metáfora usada para definir um término difícil, quase insuportável. De fato, o sentimento de perda pode ser vivido tão intensamente que transforma este período em uma sensação física, muitas vezes dilacerante. Insônia, perda de apetite, dores no estômago, tensão muscular e outros sintomas, são algumas das reações de um organismo preso a uma forte perda. Não há remédio que faça a dor desaparecer, fazendo-se necessário encarar o problema de frente. na lista de antídotos para o alívio dessa dor estão o tempo, o apoio social, as atividades relaxantes, novos projetos, etc.
Normalmente, as pessoas criam muita expectativa de encontrar a sua “metade”; alguém que as faça sentir completas. Músicas, novelas, romances, eternizam essa idéia romântica distorcida, de que existe uma versão humana que preencha o vazio construído ao longo de sua existência. Buscam, desta forma, seus complementos. Contudo, na verdade, o caminho deveria ser outro: se estou inteira, não preciso de complemento e sim, suplemento.
Por que esta busca por inteireza? Tudo se resume numa palavra: estima. Construímos uma auto imagem e nela depositamos uma certa quantidade de afeto, denominada autoestima. Pessoas com boa autoestima costumam se aproximar e atrair pessoas que estejam na mesma condição. Procuram o autoconhecimento, a alegria da troca, sem a expectativa de que cabe ao outro fazer a sua felicidade acontecer; elas a fazem. As de baixa autoestima, ao contrário, atraem situações de igual teor energético e reforçam o vazio, chamado desamparo, a cada escolha que fazem. A procura do outro como responsável pela sua felicidade e inteireza faz-se presente constantemente. A expectativa cresce e o outro precisa responder a todos os paéis que lhe faltam: pai/mãe, amigo(a), etc. A relação se mantém nesse prisma e, claro, é fadada ao fracasso. Quando advém o término, um pedaço de si vai junto e o luto traz dores, acompanhadas da sensação de fracasso, o que aumenta ainda mais o desamparo. Tudo porque é ensinado que o amor está fora e precisa ser encontrado. E se eu disser que o amor pertence à pessoa e que o outro apenas o desperta? Somos o amor que buscamos no outro pela própria incapacidade de enxergarmos que o outro apenas aponta pra ele.
Mas por que não vemos isso? Porque voltamos o nosso olhar pra fora, fazendo um escape de nós mesmos enquanto consciência. Quando o autoconhecimento se amplia, e com ele a autoestima, podemos compreender melhor esta visão. Apaixonamo-nos por nós mesmos e, nesse momento, o outro é contemplado. Resulta daí uma relação saudável e suplementar. Caso este relacionamento finde, não há perda do eu. O luto natural de uma perda é vivido sem depressões ou dores de qualquer espécie. A isso eu chamo de inteireza. Esta pessoa tanto pode viver sozinha, já que a sua companhia lhe é agradável, como pode partilhar com alguém, sem o perigo de se perder no outro.
Mas como podemos fazer para sanar as dores, no caso de baixa autoestima? Existe um caminho que ajude? Primeiro a pessoa precisa se olhar e verificar o que está fazendo com as suas escolhas. Tem cuidado de si? Tem entrado em contato com as suas carências? A busca pelo autoconhecimento é, então, a primeira coisa que deve fazer para que a aprendizagem da situação se estabeleça.
Normalmente, quando a relação se esgota, as pessoas ficam lembrando dos momentos maravilhosos que passou com o parceiro. estudos publicados no Journal of Experimental Psychology apontam que encarar o ex sob uma ótica negativa pode ser bem mais interessante, para se recuperar desta fase. Não se trata de desenvolver uma raiva pela pessoa, mas reavaliar o relacionamento, examinando a sua parte nele. O foco no que foi ruim traz uma visão mais realista para que a pessoa perceba que não há motivo para querer voltar. Percebe as muitas idealizações projetadas e isso é de grande valia. Toda a rotina da relação, ao invés de ser endeusada, ajuda a vê-l como algo a ser derrubado. Mas tem que se ter cuidado para não trocar o amor pela raiva. De nada adianta resolver externamente, se no interior a pessoa se mantém ligada pela raiva. Olhar o que foi negativo é apenas uma forma de não embelezar algo que já não é mais belo, que não serve mais para ambos. Usar o negativo para minimizar o sofrimento é libertador. Claro que se a pessoa começou a se gostar mais, o tempo de duração da sofreguidão costuma ser bem menor.
Fazer algo positivo também pode ajudar. Atividades prazerosas e boas companhias retiram o olhar da auto piedade. Na inação o pensamento vai para a dor!
O tempo também é de grande valia. Tudo nessa vida passa e é preciso ter consciência disso. Tentar preencher este vazio imediatamente com outra pessoa, traz todos os problemas anteriores para a nova relação e, o que é pior, não soma nenhuma aprendizagem.É necessário se desintoxicar! O tempo é o melhor indicador de que a dor está diminuindo, libertando o seu dono. Contudo, se esta sofreguidão perdurar, a ajuda profissional pode ajudar a libertá-lo.
Concluindo, a dor do “coração partido” existe, traz consequências físicas e psicológicas, mas pode ser ultrapassada rapidamente se o foco for a restauração de si, enquanto um ser completo. A consciência de que o amor está dentro e que não precisa fazer do outro o instrumento da sua inteireza, é fundamental. Portanto, a melhor saída é o aumento da autoestima iniciado pelo autoconhecimento. As escolhas passam a ser mais conscientes e a opção por si transcende a ideia mágica de que alguém a preencherá.

Cada relacionamento é um espelho que revela sua própria identidade.

Tereza Erthal

 

Cada aspecto da personalidade se reflete nas escolhas que fazemos na vida. Tornamo-nos alguém porque estabelecemos relações e nessas relações, espelhamos parte de nós mesmos. Tomemos como exemplo a claustrofobia: transtorno que significa medo, ou mal estar, diante de lugares fechados, sentidos como opressores. O que o indivíduo quer é restaurar sua liberdade, mas se vê impedido, aparentemente por algo externo. Incapaz de se ver com condições de restaurá-la, foge das situações que tanto o ameaçam. Contudo, de acordo com a sua ótica, suas escolhas estão permeadas por seus medos. Escolhem pessoas que reforçam, muitas vezes, tal realidade. Uma relação claustrofóbica é aquela cujo(a) parceiro(a) é um opressor e assim a mesma situação é vivida, reforçando a atual visão. É porque somos uma estrutura cujas partes se integram sempre. Assim, tal pessoa deseja ser livre, mas teme a própria liberdade.

Evidentemente que não é com o conhecimento puramente racional que essa situação termina; é preciso vivenciá-la. Contudo, a conscientização da dificuldade criada faz a pessoa a faz explorar áreas jamais antes visualizadas. O que ela faria com uma relação livre de opressão? Talvez não a suportasse. Isso porque o repertório de respostas apenas se volta para este foco. Enquanto tratarmos somente da situação externa, não eliminaremos o real problema: o medo à liberdade.

Em geral, “o homem se tornou um escravo, embora se julgue um senhor.” ( E. Fromm). Significa que está escravizado a máximas falsas que parecem levar o foco da sua vida para este mesmo lugar. Todos devem assumir sua existência e a responsabilidade dos seus atos e isso é parte da interpretação do eu. A pessoa não é apenas feita pela História, mas também é ela que a faz. E isso tem a ver com as relações. O indivíduo não pode viver sem uma certa cooperação de outros, pois a menos que sua vida tenha significado e rumo, será esmagado pela sua insignificância pessoal. Não será capaz de se relacionar com nenhum sistema que proporcione um significado e um rumo à sua vida, ficará cheio de dualidades e isso o paralisará na sua capacidade de agir, de viver.

Caso o indivíduo ainda não tenha cortado o cordão umbilical que o prende ao mundo externo, ele não é totalmente livre. Esses vínculos dão-lhe segurança e  a sensação de pertencer a algum lugar.Se a criança cresce estimulada a romper tais vínculos, ela procura a liberdade e a independência. No contínuo segurança-desenvolvimento, ruma ao risco do crescimento, já que conquistou a sua segurança. O oposto disso é a solidão- a submissão é o modo de evitar o isolamento e a ansiedade. Mas ainda existe  outro modo: o vínculo espontâneo do homem com a Natureza, uma relação que liga o indivíduo ao mundo, sem eliminar sua individualidade.

Se cada passo em direção à separação e à individuação fossem acompanhados de um crescimento paralelo do eu, o desenvolvimento da criança seria harmonioso. Mas isso não acontece. O crescimento do eu é obstado por diversas razões individuais e sociais. O hiato entre eles causa um sentimento intolerável de isolamento e impotência que, por sua vez, leva a mecanismos psíquicos conforme julga. A existência humana e a liberdade são inseparáveis- liberdade de ( não para), liberdade de determinação de suas ações.

Desde o princípio da existência o indivíduo se vê confrontado com a necessidade de escolha entre diversas linhas de ação. Isso nos leva ao mito bíblico da expulsão do homem do Paraíso. Agir contra o comando da autoridade, cometendo pecado, é o primeiro ato de liberdade, o primeiro ato humano. O pecado, em seu aspecto formal, é a ação contra o comando de Deus; em seu aspecto material, é o ato de comer da árvore da sabedoria. O ato de desobediência como um ato de liberdade marca o nascimento da razão. Mas  a recém conquistada liberdade parece-lhe como uma maldição; ele está livre do doce cativeiro do Paraíso, mas não está livre para governar-se, para realizar a sua individualidade.

O crescimento da liberdade humana sofre o mesmo aspecto dialético do crescimento individual. É um processo vigoroso de integração, domínio da Natureza, poderio da razão humana e solidariedade. Mas, por outro lado, nasce na pessoa um crescente isolamento, uma aumentada insegurança e uma insuportável impotência.

Só há uma solução possível e produtiva para o relacionamento do indivíduo com o mundo: sua solidariedade. Atua com todos os homens em sua atividade e trabalho espontâneo, que estabelece um elo cada vez maior com o mundo, não por meio de vínculos primários, mas como indivíduo livre e independente.

Em termos gerais, o processo social ao determinar o modo de vida do indivíduo, isto é, sem relação com os outros e com o trabalho, molda a estrutura do seu caráter; novas ideologias (religião, filosofia e política) resultam dessa estrutura do caráter assim modificada e exercem um atrativo sobre ela, intensificando-a, satisfazendo-a e estabilizando-a. Os novos traços de caráter tornam-se fatores úteis na ulterior evolução econômica e influenciam o processo social.

O indivíduo moderno se encontra em uma situação em que muito do que ele pensa e diz não adquire da capacidade de pensar originalmente, por si mesmo. Esta é a única forma que pode dar conteúdo à sua alegação de que ninguém pode interferir na manifestação de suas idéias.

Estamos fascinados pelo aumento da liberdade de poderes fora de nós e cegos para as nossas restrições, compulsões e medos interiores, que tendem a solapar o significado das vitórias alcançadas pela liberdade contra seus inimigos tradicionais. Porém, temos que obter um novo tipo de liberdade, aquela que nos habilita a realizar nosso próprio eu individual, a ter fé nesse eu e na vida.

Um estudo sobre a liberdade

Um exame sobre a Liberdade.
Tereza Erthal
Certamente nós nos experimentamos, e aos outros, como livres, organizando os nossos sentimentos e os nossos negócios segundo esta noção. Todo comportamento voluntário decorre disso, assim também como o conceito de espontaneidade. Se pensamos em casar e ter filhos, ou em escolhas menores como erguer um braço, temos a sensação que depende de nós o que queremos fazer. Em todos os casos, temos a sensação de termos decidido livremente e que devemos aceitar a responsabilidade por estas escolhas e decisões. Elogios e culpas são distribuídos de acordo com elas. Contudo, tais experiências de liberdade estão em briga com argumentos que possamos usar para defendê-las. É bem difícil argumentar racionalmente sobre aquilo que apenas sabemos intuitivamente. Mas, no caso da liberdade e conseqüente responsabilidade, algum tipo de embasamento racional é importante, pelo menos para ordenar nossos relacionamentos sociais.
Relacionamentos sociais estão previstos em lei e estas leis, por sua vez, repousam em nossas melhores teses sobre o que é certo e o que é errado fazer. Se não podemos defender a tese de que somos livres para escolher e responsáveis pelos resultados, capazes de discriminar entre o certo e o errado, agindo conforme esta decisão, estamos sendo fortemente dominados por alguma teoria entrante.
Toda discussão sobre livre arbítrio do homem tem sido encoberta pelo aspecto natureza humana ou pela idéia do lugar da humanidade no Universo. A eficácia, ou não, do nosso querer, e a questão de se de fato temos uma vontade, não são tidas como decorrentes daquilo que somos enquanto seres humanos. No passado, tais discussões corroboravam com o determinismo, indicando que a liberdade era uma ilusão. Os gregos chamavam tal determinismo de destino. Viam-se como bonecos de deuses caprichosos, que determinavam as tramas de suas vidas. (“Que destino cruel trouxe-me a este dever sangrento?”, próprio de uma tragédia grega.) Igualmente, a tradição cristã, especialmente protestante, era convencida de que nossas ações eram prefixadas. Haveria um plano divino por trás de todo o cenário de ações.
“ É portanto fundamentalmente necessário e saudável que os cristãos saibam que Deus prevê, projeta e faz todas as coisa conforme Sua própria imutável, eterna e infalível vontade.”(Lutero, séc.VI)
Se formos honestos conosco, veremos que possuímos resquícios destas influências hoje. Um exemplo disso são frases como: “estava destinado a acontecer”; “acontecerá, se Deus quiser”; etc. A boa notícia é que estas noções de destino exercem pouco domínio racional sobre a mente moderna. Hoje a ciência nos diz sobre a causa das coisas, incluindo sobre o nosso comportamento. Na verdade, a ciência moderna minou nosso sentido de liberdade: pelo lugar que ela nos concede no Universo e pelo modelo dado para compreender nossa natureza humana. No universo morto de Newton, seres conscientes não tem papel para conter as forças cegas. A impotência humana faz nascer a fé cega, com perda da vontade (depressão e desespero). Nossa liberdade perde todo o sentido.
A negação da liberdade, decorrente da natureza impessoal e determinista da física clássica, reflete-se no determinismo histórico de Marx. Há um determinismo imposto de fora, por forças além do nosso controle.
Freud descobriu na psique humana leis e forças que espelham a física e a química de seu tempo.
“Se toda atividade mental é resultado de forças mentais inconscientes que são instintivas, biológicas e físicas em sua origem, então a psicologia humana poderia ser formulada em termos de forças interagentes que eram em princípio quantificáveis, sem necessidade de recorrer a nenhuma ação vital mental integrativa, e a psicologia se tornaria uma ciência natural como a física.” (Freud, em Rycroft; Psychoanalysis Observed,p.13)
Assim, a psique é escrava de forças inconscientes, pois todo ato decisório é uma ilusão e a consciência não tem função. Freud contribuiu para este tipo de pensamento, tanto na psiquiatria, quanto na psicoterapia, deixando uma marca formativa na mente popular.
As idéias de Freud e de Marx, de que nossa liberdade é refém do instinto ou da História, foram propagadas por sociólogos, psicólogos e estudiosos afins. Ora, se procuro definir minha individualidade em termos clássicos, vejo-me como um emaranhado de neurônios, mas nenhum deles pode ser responsabilizado por qualquer ação que venha a desenvolver. Na física clássica fica difícil se quer dizer a palavra “liberdade”. A complexidade da causalidade é tão gigantesca que nem conseguimos sondá-la; ela está sempre presente.
Mas, na nossa visão, é impossível definir o ser humano sem confrontar o significado da liberdade. Se atentarmos para o conteúdo de nossa mente consciente em qualquer momento, assistimos a um arranjo de vários pensamentos possíveis. Estas áreas de pensamento são mais acessíveis ao adormecermos ( ao entrarmos em contato conosco, depois de apagar o murmurinho do mundo, temos imagens do passado ou mesmo do presente, apontando coisas que temos que encarar), ou em estados de meditação, mas estão sempre presentes. Sem elas, não haveria base para fantasia e para imaginação. Cada ato de concentração é um ato de realização do pensamento. Quando focalizamos um pensamento, ele se torna a realidade clássica, ou figura, enquanto outros desaparecem no fundo, como sombra na noite.
Assim, cada ato de concentração expressa alguma forma de liberdade: nada determina sobre quais pensamentos possíveis iremos focalizar, contribuindo para a natureza indeterminada da escolha. Poderiam dizer que a escolha do possível seria determinada pelo alívio de uma situação e, por isso, não livre. Ledo engano. Por exemplo, se me vejo numa situação desconfortável, talvez me pegue pensando nela com a cabeça cheia de imagens sugerindo atos como gritar, quebrar o computador, parar de pensar nisso, etc. Seja qual for a saída, ninguém poderá dizer que a escolha se deu devido ao desconforto, uma vez que todas as opções aliviariam tal sensação.O desconforto pedia apenas uma escolha e esta, em si, foi livre.
Respondendo com bom senso a muitas questões, sendo uma criatura racional, tenho capacidade de analisar as situações e refletir sobre as suas consequências. Tanto minha liberdade quanto minha responsabilidade são vistas como provenientes de tal capacidade, e por isso negamos que os animais tenham livre arbítrio.Mas a liberdade é muito maior do que nossa fé no poder da razão! Temos o exemplo de quem quer parar de fumar: decide, invoca todos os pensamentos que demonstram quanto ruim é o ato para o organismo, mas logo depois o hábito, ou vício, vence a razão. Mas, num belo dia, paro de fumar, sem nenhuma exigência. Escolhi parar. Fiz minha escolha e agi de acordo. Por quê? Nossa lógica não faz escolhas! Poderíamos dizer o contrário: são as nossas escolhas que estão associadas a um conjunto de razões ligadas a estas escolhas, que darão origem à nossa lógica. Ao fazermos uma escolha, temos uma razão para esta escolha que a nossa lógica se utiliza para explicar a escolha. Estas explicações dizem algo a meu respeito, mas não determinam a escolha em si. Precedeu a todos os “porquês”. Foi realizada num momento de liberdade e, como Kierkegaard diria, num “salto de fé”. Tal escolha é de minha responsabilidade apenas e já traz em si um fardo: faz-nos responsáveis por escolhas sobre as quais não temos pleno controle consciente (numa linguagem sartriana, uma consciência de primeiro grau).
Mas nada pode controlar a minha liberdade? Sartre diria que Não: eu sou a minha liberdade! Para exercer o controle da liberdade, pesamos as probabilidades. A probabilidade que algo ocorra está associada à quantidade de energia exigida para fazê-la acontecer. Somos livres para fazer qualquer opção, mas ao fazermos, geralmente escolhemos o mais fácil. Embora a razão não determine a escolha feita, desempenha um bom papel, pois as razões especiais ligadas a qualquer conjunto de escolhas possíveis, influenciam a probabilidade de fazermos alguma escolha em especial. Então, a associação entre razão e escolha torna as escolhas corretas mais fáceis, mas não garante o resultado desejado.
O efeito de nosso estilo de vida, e de nosso histórico de escolhas passadas, também atua sobre o peso da probabilidade futura. Mas isso não significa determinismo, e sim influência. Geralmente, a “natureza” da nossa consciência leva-nos a fazer escolhas que exijam menos esforço e menos concentração. Isso é responsável pela criação de hábitos e imitações. O hábito é uma saída para os preguiçosos, com certeza. Contudo, o habitual também é necessário em nossas vidas. A habituação pode nos deixar livres para viver mais criativamente o que mais nos interessa. Mas somos sempre livres pra realizar escolhas que despendam até mais energia , assim como podemos ir contra as probabilidades.
O exercício da liberdade repousa no cerne do nosso significado enquanto indivíduos. O fardo da responsabilidade é da nossa natureza e nem adianta negá-la. É a nossa liberdade que permitirá a nossa criatividade, chave para que nós, seres humanos, estejamos no Universo.

Existencialismo e a medicação

Existencialismo e medição
Muitos alunos me perguntam como se configura a relação entre a psicoterapia e a medicação. Em primeiro lugar, precisamos deixar claro que nenhum psicólogo está apto para medicar. Este papel é próprio dos médicos, no caso psiquiatras ou neurologistas, que têm um estudo apropriado para isto. Nosso papel é de indicar um destes profissionais, conforme o caso, e estabelecer um diálogo com eles, aumentando a chance de sucesso do atendimento.
Mas quando fazer este tipo de encaminhamento?
Os medicamentos agem na conseqüência comportamental, enquanto a psicoterapia age sobre a relação de construção da doença. Um cliente com síndrome de ansiedade, por exemplo, necessita de um medicamento, caso este sintoma esteja acima do controle da pessoa, atrapalhando ao ponto de não mais conviver socialmente. A terapia vai atuar na forma como a ansiedade acontece e o que a dispara. Alguns falam que a psicoterapia ataca a causa do problema, mas este ponto se torna bem questionável na ótica existencial.
No Existencialismo, vemos, claramente, a diferença entre causa e motivo: enquanto a causa é a apreciação objetiva de uma situação, o que deu origem real ao problema em questão, o motivo é a apreensão subjetiva de uma causa,expressa pelos desejos, emoções, pensamentos que normalmente acompanham o ato. Trata-se de uma apreensão autoconsciente, um projeto inicial de si até um determinado fim. Apreende-se o mundo como causa. Posso apreender uma série de fatores, como a grande quantidade de trabalho, a preocupação excessiva, a fraca alimentação, etc, que são motivos, como causa para a minha fadiga. As causas somente terão significado quando inseridas no projeto de alguém: aparece em e através do projeto de uma ação.
“ Não é por ser livre que os motivos são ineficazes, mas porque eles são ineficazes é que eu sou livre. A consciência é sempre consciência de qualquer coisa e, por consequência, o motivo não pode aparecer senão como correlação de uma consciência de motivo, isto é, o motivo não está nunca na consciência, ele existe apenas pela consciência. E porque o motivo não pode surgir senão como aparição, é que ele se constitui como ineficaz; a sua transcendência está, por natureza, compreendida e incluída na consciência e, sendo assim, a consciência escapa-se-lhe, ao estabelecê-lo.” Jolivet, 1975.
Causa, motivo e fim são indissociáveis da consciência que se projeta até suas possibilidades e se define por elas. Embora possamos dizer que todo ato tenha um motivo, não podemos extrair daí que o motivo seja capaz de causar o ato. Dois eventos fortemente correlacionados não necessariamente estabelecem uma relação causal; estão apenas fortemente associados. Na verdade, o motivo, o ato e o fim são partes de uma mesma estrutura em que cada um objetiva os outros dois. No entanto, é o ato que será capaz de decidir o fim e os motivos, pois o ato é expressão de liberdade. Ao contrário do determinismo, que prega uma certa continuidade da existência, concebendo o motivo como fato psicológico capaz de gerar o ato, da mesma forma que a causa determina o efeito, o Existencialismo não considera causa e motivo como coisas. Ambos são vistos como tendo significado atribuído exclusivamente pela pessoa. Para um fenômeno ter causa é preciso que esta seja experienciada como tal. Este significado depende do projeto futuro. Assim, o indivíduo determina os significados através das ações pelas quais se projeta até seus fins. Sendo o projeto uma livre produção de um fim, e que lhe confere significado. Causa, motivo e fim formam uma unidade difícil de dissociar. Portanto, é bastante difícil dizer que algo seja a real causa de um problema pelo simples fato de que muitas outras variáveis entraram neste curso posteriormente e, muitas vezes, a primeira causa ficou secundária diante da força de alguma destas variáveis. Quando trabalhamos com os motivos, muitas questões se aclaram e uma compreensão maior se torna viável.
Esclarecido este ponto, entramos em contato com a classificação diagnóstica e o Existencialismo. O que seria uma doença mental? Para nós existencialistas, não existe uma teoria geral que seja capaz de explicar a patologia da conduta, pois isso iria contra os princípios filosóficos propostos, a saber, o de que cada indivíduo é uma pessoa concreta, única, livre e realizadora de si mesma; rebelde, portanto, a enquadramentos diagnósticos. Preocupados em ressaltar a dignidade existencial, repudiamos a classificação, já que fragmenta o homem. Estamos mais preocupados em “des-cobrir” o molde sobre o qual o cliente se criou do que lhe impor um padrão. A perspectiva do trabalho é descritiva, uma vez que somente se pode compreender qualquer desordem de conduta de um indivíduo enquanto tal a partir dele mesmo, isto é, tomando-o como unidade fundamental. Mas encarar os problemas como oriundos de conflitos, aspirações, enfim, angústias, decorrentes de necessidades existenciais, é ainda muito difícil de ser aceito. A conscientização de si mesmo não é algo fácil de ser atingido pelo cliente, uma vez que ocasiona uma enorme carga emocional. Quando o peso é grande, é mais fácil obter refúgio em divindades ou na expectativa de que algum destino se faz cumprir.
O problema da classificação psiquiátrica parece residir numa única premissa: existem comportamentos anormais que precisam ser categorizados em prol de um mérito moral. É como se o diagnóstico psiquiátrico definisse a identidade pessoal. Mas classificar algo ou pessoas é próprio da ciência, para obter controle sobre aquilo que é nomeado. Claro que a classificação facilita a linguagem entre profissionais, objetivando a linguagem, favorecendo análises estatísticas e certas previsões de comportamento. Entretanto, considerando que o comportamento humano é algo único, baseado na livre escolha, é um contra senso tentar encaixá-lo em algo pré-existente.
Existe certa lógica em considerar que, de um certo modo, somos um tanto “ insanos”. Basta comparar as nossas ações diárias, no que toca a seu significado, com as atividades de outros no mundo, que nos parecem, às vezes, por demais ridículas. Como se pode ser tão são diante de tanta insanidade? Óbvio que existem aqueles que têm um tipo específico de insanidade, e que por isso a sofrem de um modo diferente daquele experimentado por nós. Parece que eles têm o direito de viver uma existência humana, ainda que de uma perspectiva diferente da nossa. Assim, existe uma noção limitada de insanidade que se antagoniza com a noção de uma insanidade viável.
Não se trata de negar que existem diferentes modos de “ser-no-mundo”, mas o que se questiona é o propósito do ato classificatório que, muitas vezes, leva a uma forma desumana e impossível de lidar com os problemas existenciais do ser. O árbitro teórico é tão amplo e de tantas conseqüências que não é raro se verificar o desenvolvimento de doenças iatrogênicas. Além do mais, quando se fala em doença, tem-se como parâmetro a saúde; e determinar um conceito de saúde parece inútil, quando se tem imaginado a essência do homem como ser não acabado. (Jaspers, 1966)
Os clientes que normalmente visitam nossos consultórios são “normais “, com problemas existenciais, ou neuróticos, apresentando um conjunto de comportamentos aprendidos que serviram diante de uma situação de sufoco, mas que já caducaram. O cliente, neste caso, não se dá conta de que a sua utilidade expirou e continua dando as mesmas respostas a todas as situações ameaçadoras. A neurose é uma espécie de método de conduta desenvolvido para defender a própria existência. Obviamente, a noção da própria existência está distorcida, mas o comportamento resultante está coerente com esta imagem criada. Também os marcos diferenciais são muito difíceis de delimitar, pois cada indivíduo desenvolve uma dinâmica própria. Contudo, existem comportamentos que se mostram bem característicos, exatamente pelo exagero de suas manifestações.
O desajuste é o resultado de uma escolha que o indivíduo faz, produto de sua própria criação. A liberdade para escolher não necessariamente assegura que as escolhas sejam sábias. A desordem da conduta surge como resultado do conflito entre mudar-se (de ser) e a de manter-se inalterado (não ser). A ansiedade resultante faz nascer o desajuste, uma forma que o indivíduo escolheu para lidar com o peso da angústia. May nos diz que a neurose é o método que o indivíduo usa a fim de preservar o seu centro. Pra ele, neurose é uma adaptação, justamente aí que radica o seu “mal”.
Se a conscientização da liberdade, pelo próprio indivíduo, é o que dá significado à vida, todo o uso da neurose como forma de manipulação do meio é um resultado de uma perda do sentido da vida. A terapia pode dar conta deste aspecto, mas das conseqüentes ramificações sintomáticas, o profissional apropriado é o psiquiatra. Uma avaliação diagnóstica pode ser importante para diminuir sintomas, como a ansiedade ou a depressão, que um paciente vive. Uma vez suavizada a sintomatologia, o caminho fica mais aberto para os resultados terapêuticos.
Mas ainda têm os pacientes psicóticos, menos comuns nos consultórios de psicoterapia. Estes requerem um acompanhamento medicamentoso com mais freqüência. Costumo dizer que, nestes pacientes somos mais facilitadores e coadjuvantes do que profissionais principais. Nosso papel seria o de ajudar a socialização ou adaptação social.
Se a nossa preocupação é idiossincrática, nada mais importante do que captá-la para ajudar o cliente a se estruturar. Se a percepção do mundo do “neurótico” está distorcida a ponto de não estar vivendo bem com ele mesmo, o comportamento determinado pela sua percepção será alterado na medida em que se modifica. Um trabalho conjunto com o médico é super necessário, quando há a prescrição medicamentosa. O psiquiatra necessita saber como são os seus projetos, qual a forma de manipular os sintomas, a forma como escolhe lidar com o mundo… Embora tenha recursos para fazer uma boa avaliação, muitas coisas escapam à primeira vista. Trago um exemplo que pode vir a clarificar este ponto:
Fui procurada por uma mulher que vivia em depressão. Tinha acabado de ter um filho e, durante a gravidez não fez uso de nenhum medicamento pra assegurar a saúde do bebê. Estava em ponto de bala! Chorava muito e dizia que não havia se matado por causa do filho. Nada em sua vida estava fora do lugar, mas sentia como se nada fizesse sentido. Formada, não conseguia trabalhar por causa dos seus sintomas. À medida que fomos estreitando o relacionamento clínico, fui percebendo que a sua ansiedade era gigante e, por isso, nada começava, pois não conseguia concluir. Seu diagnóstico tinha sido de depressão, no que eu discordava. Entrei em contato com a psiquiatra e tivemos um ótimo diálogo. Na minha opinião, sentia que era mais um transtorno de ansiedade e que, no pico, resultava numa depressão forte. Sugeri que os remédios fossem dirigidos para a ansiedade, e ela concordou em experimentar. O que tinha demorado meses para melhorar, em um mês tivemos resultado favorável. Claro que a parte medicamentosa, dada pela psiquiatra, foi de suma importância, mas foi através do diálogo entre as partes interessadas que a cura se desenhou. A parceria é extremamente necessária.
Não posso acreditar que um tratamento psicoterápico resulte em sucesso se não houver um diálogo inteligente entre os médicos responsáveis pelo paciente. Este diálogo não precisa ser apenas com o psiquiatra. Tive uma experiência bem interessante:
Uma paciente foi-me indicada para fazer um diagnóstico (eu era professora de psicometria). Seu marido me disse que ela tinha tido surtos e achou melhor trazê-la do sul pra cá e se tratar. Ele era médico cardiologista e viu seus sintomas desta forma. Achou que poderia ser uma espécie de comportamento anti-social também, pois depois que emagreceu muitos quilos, passou a se exibir na pequena cidade, com mini saias, pegando garupas de garotões, etc. Fiz várias entrevistas e apliquei testes que pudessem elucidar tal mistério. Em nenhum momento encontrei qualquer comportamento que indicasse isso. Continuei pesquisando. Encaminhei-a a um amigo psiquiatra pra fazer uma avaliação. Nada encontrou, a não ser comportamentos neuróticos. Pesquisando encontrei que ela havia tomado remédios para a tireóide para poder emagrecer, atingindo a hipófise. O teor do remédio era alto e, como li, os sintomas podiam ser semelhantes a uma crise psicótica. Além do mais, ela estava se comportando como uma adolescente que queria recuperar o tempo perdido ( havia perdido 32 quilos em dois meses!). Em diálogo com o endocrinologista e com o psiquiatra amigo, retiramos os remédios desnecessários e uma psicoterapia teve início, pra fazer a adaptação a esta nova imagem. Apenas um ansiolítico e muitas conversas a fizeram restaurar o equilíbrio.
Do que foi exposto, fica claro que a medicação tem sua importância, que somente pode ser administrada por um médico especialista e que o terapeuta precisa trabalhar em conjunto com o médico que assiste o paciente ( seja ele psiquiatra, neurologista, endocrinologista, ou de outra natureza). Chama-se a isso de abordagem interdisciplinar, super apropriada quando se pensa no paciente como uma pessoa. Desta forma, podemos trabalhar a pessoa como um todo e cada profissional envolvido é capaz de dar a sua contribuição.
Conclusão:
Terapias que buscam a compreensão do indivíduo apoiadas simplesmente no puro arbítrio teórico, fazem um entendimento distorcido, reforçando apenas a sua verdade. A rigidez de seus dogmas implica em rigidez de atitudes e o resultado é a perda da compreensão real do cliente. Um estudo criterioso sobre quem está diante de nós faz-nos contactar com os profissionais que também trabalham o paciente, em algum grau. Pode ser que seja necessário um encaminhamento para amenizar os sintomas que atrapalham a visão da realidade. Mas não basta apenas esta indicação. É necessário que trabalhem juntos em benefício do cliente.

O Amor é a chave.

A ansiedade é uma das características mais habituais da conduta contemporânea. O competitivismo da sobrevivência e os fatores constringentes de uma sociedade eticamente egoísta, impulsionam a insegurança no mundo emocional das pessoas.A disputa de cargos e funções bem remuneradas, a constante aquisição de recursos, a prepotência de governos inescrupulosos, anúncios ameaçadores de doenças ou catástrofes da natureza prenunciando tragédias iminentes, a catalogação de crimes e violências são responsáveis, na maior parte das vezes, pelo medo que invade todos os meios sociais. Estas constantes ameaças conduzem a permanentes medos que defluem as incertezas da vida.
A constante preocupação de parecer vencedor, de responder de forma semelhante aos demais, de ser admirado, desumanizou o ser humano, que , tornando-se um elemento do grupo social, passou a não ter identidade ou individualidade.
Sabemos que a ansiedade tem manifestações e limites naturais, perfeitamente aceitáveis. Contudo, quando se extrapola para os distúrbios respiratórios, sudorese, perturbações gástricas, etc, o clima de ansiedade caminha para a somatização física em graves danos para a vida.
O maior desafio para o homem é o autoconhecimento. Identificar a sua realidade emocional, suas necessidades, suas legítimas aspirações, são fatores importantes a considerar, nem sempre fácil de atingir. O aprofundamento de descobertas íntimas vai alterando a escala de valores e levando a novas significações para a sua luta, contribuindo para a autoconfiança.
A ansiedade trabalha contra a estabilidade do corpo e da emoção. A verdadeira finalidade desta existência corpórea seria uma vivência salutar da oportunidade orgânica, sem o apego mórbido ao corpo, nem o medo de perdê-lo. Mas apegado aos conflitos da competição humana, deixando-se vencer pela acomodação, há um desvio desta finalidade, que se resume na aplicação do tempo para a aquisição dos recursos eternos propiciadores da beleza, paz e perfeição.
O pandemônio gerado pelo excesso de tecnologia e conforto material das classes abastadas, com absoluta indiferença pela humanidade dos guetos e das favelas, em promiscuidade assustadora, revela a falência da cultura e da ética no imediatismo materialista. O abuso da falsa cultura desnaturada, que pretendeu solucionar os problemas humanos, resultou na correria alucinada para lugar nenhum e pela conquista de coisas mortas, incapazes de sanar a ansiedade.
Propalando-se que as conquistas morais fazem parte das instituições vencidas- matrimônio, família, lar- os loucos creem que aplicam, na velha doença das proibições passadas, uma terapêutica ideal. A sociedade atual sofre a terapia desordenada que usou na enfermidade antiga do homem, que ora se revela mais debilitado que antes.
O que fazer? São válidas as lições sobre amor, solidariedade fraternal, compaixão que geram pensamentos otimistas e atitudes mais humanas neste mundo enlouquecido pela ganância. Tais atitudes mais compreensivas, não somente conduzem a uma forma de relação mais tranquila, sem disputas conflitantes do passado ou acomodações coletivistas do presente, como revertem o olhar para a observação e conhecimento de si. Esta aprendizagem favorece uma relação harmônica com o Universo, pois trata-se de uma atitude natural, resgatada neste modus operandi.
É preciso deixar claro que existem dois dias plenos de ansiedade: o ontem e o amanhã. Não existe a menor possibilidade de vivê-la no presente, pois não há necessidade de antecipar ou relembrar situações que a expressam firmemente.
Qualquer comportamento que coage, reprime, viola é adversário da liberdade.A sociedade estabelece que a liberdade é o direito de fazer o que a cada qual apraz, sem dar-se conta de que essa liberação da vontade, termina por interditar o direito dos outros, fomentando as lutas individuais, dos que se sentem impedidos nas violências de grupos e classes, cujos direitos encontram-se dilapidados. Se cada um agir conforme achar melhor, considerando-se liberado, esta atitude trabalha em favor da anarquia, responsável por desmandos sem limites. Aliás, em nome da liberdade, atuam desonestamente os vendedores de paixões ignóbeis, vendendo mercadorias de prazer e loucura.
A liberdade é um direito que se consolida, na razão direta em que o homem se autodescobre e se conscientiza, podendo identificar os próprios valores, que deve aplicar respeitando a natureza e tudo o que nela existe. A agressão ecológica demonstra que o homem, em nome da sua liberdade, destrói, mutila, mata e se mata, por fim, por não saber usá-la como deveria.
nenhuma pressão de fora pode levar à falta de liberdade, quando se consegue ser lúcido e responsável interiormente, portanto, livre. Nela a ansiedade escapa. Diria que a liberdade é uma atitude perante a vida e, assim, só há liberdade quando se ama conscientemente. E no estado do amor, a ansiedade perde a cor.
Concluo, que para a ansiedade constar de níveis sadios, a liberdade é imprescindível e o Amor é a chave para abrir esta porta.